Como a China se desenvolveu tão rapidamente?

Por Leon Ayres – janeiro/2023

Minha curiosidade histórica sobre a China

Desde cedo a China me despertou muita curiosidade. No início, olhava para ela com um olhar místico, como um aprendiz que sonhava encontrar um monge no alto da montanha, que me ensinaria como seria o universo e nosso papel nele.

Durante certo período da adolescência as artes marciais chinesas me despertaram para tentar aplacar uma necessidade ingênua: fazer coisas difíceis, ou quase impossíveis. Não cheguei a este ponto, mas foi divertido. Longe de ter alcançado alguma virtuosidade, pelo menos imaginei que ficaria mais protegido e protetor. Não é verdade, mas fiquei satisfeito em achar. Pelo menos, fiquei um pouco mais confiante.

Minha mãe, que também acreditava em reencarnação (acreditava em todas as religiões, mesmo que tivessem contradições entre elas), havia consultado um médium que afirmara que eu já tinha sido um chinês. Achei pitoresco, mas não me encantei com esta história.



Dado o meu interesse, quase que vital, sobre o universo, resolvi aprender um pouco sobre o Taoísmo. Fui à Federação Taoíosta para beber na fonte. Esperava encontrar alguém com a aparência semelhante ao filósofo Lao Tsé, mas, para minha surpresa, quem veio conversar e me orientar sobre o assunto foi um chinês muito jovem cujos cabelos iam até a cintura. Uma das pessoas mais inteligentes que conheci. Aprendi um pouco e continuo pensando diariamente sobre o Tao. É muito difícil entender o caminho, a sua construção e a busca pelo inalcançável. Mas continuo tentando.

Na minha militância política conheci algumas pessoas que se diziam maoístas. Fiquei impressionado com as suas discussões, mas não me identifiquei politicamente. Critiquei muito a visão deles sobre a construção do setor primário da economia. Achava que esta política não iria muito longe, pois sem o setor secundário não haveria o desenvolvimento necessário para gerar tecnologias e riquezas do mundo moderno.  Depois critiquei o período de desenvolvimento do setor secundário que seria realizado através das parcerias de joint ventures (empreendimentos conjuntos) com empresas multinacionais, principalmente na Manchúria, região localizada no nordeste da China. Eu estava errado…

A China é um dos maiores casos de sucesso da humanidade, mas o motivo do seu desenvolvimento ainda está para ser compreendido, pois, no ocidente, não temos paradigmas amadurecidos o suficiente para analisá-la.

A vida é feita de encontros

O que me inspirou a escrever este texto foi um artigo (que eu recomendo) do professor Elias Jabbour em conjunto com o professor Luiz Fernando de Paula, intitulado “A China e a “socialização do investimento”: uma abordagem Keynes-Gerschenkron-Rangel-Hirschman, publicado pela Revista de Economia Contemporânea.

Prof. Elias Jabbour

Eilas Jabbour é Professor Adjunto da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas da UERJ. Ele é um dos maiores especialistas sobre o processo de desenvolvimento da China. E Luiz Fernando de Paula é professor Titular da FCE/UERJ e do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da UERJ e pesquisador do CNPq.

Estou na porta de entrada, antes do vestíbulo, tentando aprender mais sobre como se deu o desenvolvimento vertiginoso e singular da China nos últimos 50 anos.

Aprendi um pouco, não paro de pensar sobre o assunto e por isso resolvi escrever este texto, pois cada vez que eu escrevo imagino ou finjo conhecer mais sobre o assunto. Não imagino que serei fiel ao artigo, pois reconheço as minhas limitações nas análises econômicas. Mas fiquei empolgado.

Espero ser útil àqueles que se interessam pelo assunto, mas, como eu, não têm um conhecimento técnico aprofundado. Se você achar que está faltando muita coisa no meu texto, então estaremos juntos nas dúvidas e pesquisas.

O desenvolvimento econômico

O capitalismo começou a se estruturar em 1800, logo após a Revolução Francesa, que foi um movimento político insurrecional popular aliado aos interesses de uma burguesia que começava a consolidar seu espaço político-econômico. Ou seja, há mais de 200 anos atrás.

Alguns países se desenvolveram bastante durante este período, notadamente a Alemanha, França, Inglaterra e Estados Unidos da América. Claro que outros acompanharam este desenvolvimento, mas poderíamos dizer que os primeiros ficaram no topo da “cadeia alimentar”.

A China se tornará a maior potência econômica do mundo até o final desta década. Mas como ela conseguiu se desenvolver em pouco mais de 50 anos? Qual modelo eles utilizaram para conseguir este resultado tão rapidamente?

Há, na atualidade, dois modelos de desenvolvimento que se contrapõem: o ortodoxo e o heterodoxo. Existe uma grande diferença entre estes modelo: o mecanismo básico do desenvolvimento.

No modelo ortodoxo o desenvolvimento é realizado espontaneamente pelo mercado, principalmente o financeiro que é considerado o grande investidor. Se o mercado estiver forte, ele investirá, criará empregos, gerando renda, lucratividade e progresso. A iniciativa privada tem um papel de maior relevância do que o Estado: “mais empresas no Estado e menos Estado nas empresas”.

No heterodoxo, o Estado tem o papel de regular a dinâmica de desenvolvimento a partir das políticas públicas. O processo é alavancado pelo aumento do emprego e renda, que propiciará as vendas de produtos no comércio, que vai adquirir da indústria, que comprará dos fornecedores de matérias primas. Segundo vários economistas, este é o modelo que propicia um desenvolvimento mais rápido.

Meu objetivo não é a análise das opções político-ideológicas de governos, mas a observação dos dois modelos tradicionais de desenvolvimento econômico.

O modelo ortodoxo

Um destes modelos é o que muitos denominam atualmente como o “Consenso de Washington”.

“Tem como base a ideologia neoliberal a partir dos EUA e do Reino Unido que se difunde no mundo a partir de uma agenda de reformas liberais, voltadas para economias emergentes (desregulamentação dos mercados, redução do papel do Estado, privatização, abertura financeira etc.) e difundidas por instituições multilaterais, como Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Banco Mundial. Para uma avaliação do Consenso de Washington, ver, entre outros, Stiglitz (1999) e Williamson (2000)”. (Citação de Elias Jabbour).

Este modelo tem uma visão que baseia-se na combinação de atuações do capital (nacional e estrangeiro) em privatizações e desregulamentação do mercado. É um dos modelos adotados em alguns governos no Brasil. Fortalece o mercado financeiro que dita as políticas, inclusive para os setores industriais e de serviços. O setor agropecuário é influenciado pelo mercado financeiro, mas nem tanto, devido à sua capacidade de escalabilidade de produção e exportação.

O desenvolvimento privilegia os setores detentores do capital. No Brasil estes setores detêm cerca de 95% do capital nacional, enquanto o resto da população fica com apenas 5%. É o modelo preferido do mercado financeiro.

O modelo heterodoxo

O modelo heterodoxo, também denominado desenvolvimentista, tem a percepção do papel do Estado como agente principal do processo de desenvolvimento. Foi adotado no Brasil entre 1930 e 1961 e nos governos recentes da socialdemocracia. Avançou, mas não passou do primeiro ciclo de transferência de renda.

O economista John Maynard Keynes, uma das grandes referências teóricas sobre o desenvolvimento capitalista, ressalta os diferentes aspectos da relação Estado e mercado e suas complementaridades. Para Keynes o Estado é responsável, indutor e às vezes regulador do desenvolvimento econômico.

Na China o modelo heterodoxo utiliza o método histórico-dedutivo. A ideia é criar diversos ciclos econômicos que se modificam ao longo do tempo para atender as necessidades do momento, no processo mais geral de desenvolvimento. Cada ciclo cumpre suas finalidades táticas dentro de um contexto estratégico de desenvolvimento. O Estado atua, não somente no nível do controle da indústria e das finanças, mas também como grande investidor.

A China e os ciclos de desenvolvimento

Um sistema planejado e gradual

O modelo de desenvolvimento na China se dá de forma gradual e planejada. Este gradualismo planeja e analisa cada ciclo de desenvolvimento. Desta forma permite-se que o próximo ciclo tenha como base o resultado do anterior. Assim, há como ajustar cada ciclo em função dos erros e acertos do ciclo anterior. O papel do planejamento, em suas diferentes formas, é amplo e em sintonia com a evolução institucional do Estado e do mercado.

O modelo adotado pela China tem seus aspectos cartesianos de condução dos projetos: análise, planejamento, execução e controle de qualidade. Utiliza-se como filosofia o controle dos ciclos dos projetos e instituições, através da definição do espaço político com a liberdade e a capacidade de o governo identificar e buscar a combinação mais apropriada de políticas econômicas e sociais para alcançar um desenvolvimento equitativo e sustentável que seja mais adequado ao seu contexto nacional específico.

Em cada um destes ciclos mudam-se as instituições e o seu caráter. Muda-se o papel do mercado e do setor privado segundo necessidades do planejamento e investimento. Há uma noção de complementaridade entre o os dois.

Evitando o processo predatório no desenvolvimento

O Estado tem um papel de guiar o desenvolvimento evitando a disputa predatória do mercado desregulado e das injunções políticas conjunturais. Não é incomum, nos modelos de desenvolvimento do capitalismo ocidental, o crescimento conduzido pela lei do mais forte. Quem é mais forte devora o mais fraco. Há pouco espaço para os empreendimentos dos pequenos e médios, que são a maioria em quantidade e empregabilidade. Quem toma conta das galinhas são as raposas. Na China isto é resolvido pela regulação e complementariedade entre Estado e o mercado.

Esta complementaridade também visa garantir os investimentos para o consumo da população e evitar que o Estado possa ser um substituto do setor privado e do próprio mercado. O Estado passa a ser empreendedor e investidor, em atendimento às necessidades da população chinesa em cooperação com a iniciativa privada. Tudo isso mediado por um complexo sistema financeiro.

O papel do sistema financeiro

Um sistema financeiro não alinhado com as necessidades produtivas gera lucros para si sem contrapartida de geração de riquezas e desenvolvimento nacional. Regular o mercado financeiro não é exclusividade chinesa. Acontece o mesmo na Alemanha e Polônia, por exemplo, onde os tipos de governos diferem-se entre si e da própria China. Na Alemanha os investimentos do sistema financeiro obrigatoriamente são direcionados para as aptidões locais. Os orçamentos e investimentos são decididos no nível municipal.

Em um município onde, por exemplo, as aptidões são a cultura de uvas e a fabricação de vinhos, o sistema financeiro tem que priorizar os investimentos nesta atividade. Todos ganham. O sistema financeiro não se enriquece da noite para o dia, mas garantem-se os projetos de médio e longo prazo. Seja de direita, de centro ou de esquerda, os governos não conseguem mudar esta estruturação de planejamento e investimentos.

O ciclo da abertura econômica

A partir de 1970 a China iniciou um processo de abertura econômica através da relação entre o Estado, mercado, iniciativa privada e sistema financeiro, através da centralização do grande capital em torno de cerca de 50 empresas estatais. As empresas estatais são garantidoras da produção (seja qual for o momento econômico) e balizadoras dos preços dos produtos e serviços.

Empresas privadas e públicas produzem serviços e produtos para responder às demandas da população. As empresas públicas servem para que o Estado avalie quais são os reais custos e benefícios operacionais das empresas estatais e privadas.

Em São Paulo, por exemplo, em determinado momento, as empresas públicas de transporte não tinham a responsabilidade de dar resposta a todas as demandas da população, mas ajudavam o gestor público a analisar os custos e modelos operacionais das concessões dos modais de transporte privados, inclusive definindo a necessidade de subsidiar o transporte privado.

O processo de abertura econômica na China foi regulado e racionalizado para o desenvolvimento de todos os setores econômicos da sociedade. Cresceram as empresas chinesas, as empresas multinacionais que se estabeleceram na China e a população, que antes miserável, agora atingiu um crescente padrão de classe média poupadora e pequeno-investidora.

A China vive um processo de desenvolvimento e crescimento singular na história da humanidade. Além deste crescimento veloz e gigantesco, tem hoje uma demanda de consumo nacional e internacional. 

Em matéria de desenvolvimento tecnológico, saiu do copiar produtos com baixa qualidade ao desenvolvimento de grandes tecnologias.

Nestes últimos 35 anos a China teve crescimentos muito significativos, destacando:

– Crescimento médio do PIB em 9,5% a.a.;
– Aumento da Renda Per Capta: de US$ 250 (1980) para US$ 9.040 (2014);
– Investimento: 45,6% do PIB (2015);
– Reservas cambiais: US$ 35,9% do PIB;
– Tornou-se a maior credora líquida do mundo: US$ 1,97 trilhão ou 20% do PIB (2015);
– Tornou-se uma das maiores potências (comercial, industrial e financeira).

A nova Ordem Mundial

A China cresceu em 60 anos mais que os países europeus, que são seculares, e os próprios EUA. Do ponto de vista da gestão optou-se pelo que atualmente se chama de “política de projetamento”. Tudo é desenvolvido através de projetos.

A China cresceu em 60 anos mais que os países europeus, que são seculares, e os próprios EUA. Do ponto de vista da gestão optou-se pelo que atualmente se chama de “política de projetamento”. Tudo é desenvolvido através de projetos.

O que o Brasil tem a ver com isso tudo?

O Centrão nasceu no início do império?

O Centrão é considerado um dos males políticos do Brasil. E alguns pesquisadores estão chegando à hipótese de que ele não nasceu recentemente, mas quando as oligarquias se ofereceram para “dar governabilidade” a Dom Pedro I.

Eram setores escravistas que odiavam o povo. Verdade ou não, tem tudo a ver…

O Brasil acaba de sair de um governo cujo modelo de desenvolvimento é semelhante ao ortodoxo. Digo semelhante porque tem as políticas econômicas hegemonizadas pelo mercado de capitais, mas ainda é governado por um sistema patrimonialista das primeiras oligarquias.

Em 2023 a socialdemocracia ascende novamente ao poder trazendo consigo as bandeiras desenvolvimentistas, mas sem poder suficiente para implementá-las. A socialdemocracia teve que fazer concessões, abrigando em sua frente política parte dos setores que dominaram o governo anterior.

Há de se ter muita habilidade política e de negociação para retomar o modelo desenvolvimentista.

Política não é novela

Os nossos livrinhos de escola, os meios de comunicação e, agora, as redes sociais, tentam convencer a todos que a política é uma novela de embate entre o bem e o mal, encarnados em personagens.

Espero que este texto ajude a refletir a política como o embate de conflitos de interesse sociais, e não pessoais.

Política é a intermediação de conflitos de interesses sociais. As personagens são apenas instrumentos passageiros. Estes conflitos e embates existem há muitos séculos, muito antes destas personagens terem nascido.

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As novas guerras na Nova Rota da Seda

A Nova Ordem Mundial

HOSPUB e Prontuário Eletrônico não foram atingidos pelo ataque de hackers na Prefeitura do Rio

Leon Ayres em 16/08/2022

Circulou pela imprensa que sistemas da Prefeitura do Rio sofreram ataques de hackers.  Gostaria de dividir uma reflexão com os que trabalham com Tecnologia da Informação, gestores da saúde e beneficiários desses serviços.

Como foi noticiado

Às 2h desta segunda-feira, técnicos do Iplan detectaram que o Datacenter da Prefeitura do Rio foi alvo de um ataque cibernético. A ação criminosa indisponibilizou o acesso a vários serviços prestados aos cariocas, como o portal Carioca Digital, o Nota Carioca e o Rio Mais Fácil.  Vale destacar que a equipe do Iplan conseguiu evitar que os sistemas fazendários fossem afetados pela ação do hacker. Mas, por segurança, eles estão fora do ar até que toda a operação da Prefeitura do Rio volte ao normal. No momento, técnicos do Iplan trabalham para restabelecer todo o sistema.

Ambientes escuros

A velocidade da modernidade não nos protege dela mesma. Os sistemas nos fortalecem, mas, naturalmente, nos vulnerabilizam. Não dá para falar “qual é a última” porque enquanto estivermos explicando, ela se tornará “a penúltima”, pois outra já terá surgido.

Ou seja, sempre há riscos por causa do rápido avanço tecnológico que tem muitas “áreas escuras”. Até o Pentágono, a Nasa e outras entidades que se utilizam de alta tecnologia já foram invadidas.

Mas temos uma saída importante para lidar com este mundo escuro da segurança. Está  baseada no amadurecimento da observação profissional, que não sai utilizando novas tecnologias como se fossem a solução por si só. Uma cilada através do desnecessário consumismo tecnológico. A tecnologia é uma expansão de nós mesmos. Temos que adquirir experiência para utilizá-las. O mundo da Tecnologia da Informação é cheio de “Cavalos de Tróia”.

A maturidade do HOSPUB e a juventude do Prontuário Eletrônico

O HOSPUB tem algumas filosofias amadurecidas. Ao longo dos seus 37 anos de idade vem colhendo e atendendo demandas de cerca de 500 unidades de saúde em todo o Brasil. O HOSPUB tem mais de 2.500 funcionalidades e é o sistema público de gerenciamento hospitalar de maior sucesso no Brasil.

É um dos mais seguros também. Possui uma filosofia de cópias automáticas de segurança periódicas (várias vezes ao dia) que são gravadas em diversos locais ao mesmo tempo.  Não houve um caso sequer de invasão ao banco de dados do HOSPUB. Por seguir regras de segurança singulares e extremamente complexas, o banco de dados do HOSPUB tem garantidas proteções às informações. Os bancos de dados lançados mais recentemente no mercado são profundamente conhecidos e invadidos por hackers em todo o mundo. Não se pode esconder atrás de uma porta que todo mundo sabe abrir…


O HOSPUB e o Prontuário Eletrônico trabalham totalmente integrados. O HOSPUB é um sistema para a parte de gerenciamento e administração hospitalar, e o Prontuário Eletrônico trata da assistência. 

Nenhum dos dois sistemas foi atingido pelo ataque de hacker. Um fator importante, que favoreceu a proteção dos sistemas e seus dados, foi a sua arquitetura de instalação. Cada unidade tem o seu servidor onde estão os sistemas e dados. Se estes estivessem simplesmente centralizados em um servidor, ficariam vulneráveis.

A Prefeitura do Rio de Janeiro investiu e continua a investir na informatização hospitalar e está tirando um grande proveito pelo fato de ter um projeto que traz vantajosidade, segurança e alto desempenho a baixíssimo custo.

Este ataque cibernético não atingiu o HOSPUB nem o Prontuário Eletrônico.
Em dias de tempestade é que descobrimos se o nosso barco é bom ou não.

Um projeto de futuro

O município tem noção da importância da utilização do HOSPUB e Prontuário Eletrônico e está ampliando as suas  utilizações como meta de governo. O município também está dando um passo importante na direção da unificação dos prontuários existentes. Para evoluir com segurança o município deverá tomar decisões importantes

São ações relativas à segurança e desempenho dos dois sistemas. Os bancos de dados  devem ficar contingenciados tanto nas unidades de saúde, quanto no banco de dados que funcionará como centralizador. Os dois níveis trabalham juntos e garantem continuidade dos serviços, mesmo em caso de pane.

Esta é uma experiência exitosa, funciona, garante segurança e desempenho.  Não há nada de moderno ou de antigo nesta ideia. É resultado de uma experiência real no município de Porto Velho e no governo de estado de Rondônia, onde toda a rede de atenção está interligada desta forma. Os sistemas não caem nem são invadidos.

Os projetos nascem dos grandes projetos. Mais duradouros do que os projetos de governo, os de estado garantem a estrutura do futuro de médio e longo prazo. O HOSPUB e o Prontuário Eletrônico foram implantados no município com a finalidade de cumprir esta meta. Dar cidadania, assim como ferramentas ágeis para os profissionais de saúde e gestores da rede de atenção. E felizmente está cumprindo.

Leon Ayres

Analista de Sistemas
ex-Chefe da Assessoria Técnica da Informação da SMS-RJ

A Nova Ordem Mundial

Estamos vendo na imprensa (marrom, vermelha, desbotada e outras cores) uma série de artigos onde vemos o termo A Nova Ordem Mundial. Mas vamos tentar entender este termo, para não submetê-lo ao reducionismo da moda, assim como: protagonismo, narrativa, janela de oportunidade etc.

Você também pode ler em PDF. Clique aqui para baixar.

O que é Ordem Mundial (conceito simplificado )

A Ordem Mundial é um tipo de estruturação do poder onde um ou vários países conseguem determinar formas de subordinação de outros. Digo países porque estamos nos referindo aos períodos onde estes já estão estruturados. Este poder subordinante se utiliza de mecanismos de dominação no campo econômico, político e militar. Distingo o campo militar, apesar de ele ser a derradeira ferramenta para a garantia do campo político.

Vamos usar alguns tipos de Ordem Mundial para tentar definir melhor as configurações delas:

Ordem Unipolar, quando apenas um país é capaz de garantir os seus interesses na Ordem Mundial.

Ordem Bipolar, quando dois países disputam, mas têm a hegemonia.

Ordem Multipolar, quando mais de dois países estão nesta hegemonia.

Há muita literatura interessante sobre este assunto, com os mais diversos matizes ideológicos para analisá-lo.

O desconforto bipolar

Durante um bom tempo os EUA conseguiram ditar as regras e monopolizar a Ordem Mundial. O fato de conseguirem impor o dólar como moeda comercial mundial e terem a maior força armada do mundo fez com que se candidatassem a serem o novo império mundial. Seu antecessor foi o Império Britânico, o maior da história em termos de territórios não-contíguos conquistados. O maior império contíguo foi o Império Mongol. 

Os EUA conseguiram manter a sua hegemonia desde o pós II Guerra Mundial. Eles saíram desta guerra com o ótimo poderio bélico, controlando o comércio mundial, os investimentos em engenharia e desenvolvimento. 

Dominaram o cenário político aglutinando até os seus rivais de guerra. Muitos aderiram à Nova Ordem Unipolar, inclusive os nazistas que migraram para os EUA, adquiriram cidadania e ajudaram no desenvolvimento da engenharia militar e farmacêutica. O programa espacial e de mísseis militares americanos foram desenvolvidos pelos engenheiros mecânicos e químicos da antiga alemanha nazista. Mas não só estas atividades. Desenvolveram muitas fábricas que produzem manufaturados que consumimos até hoje. 

Cabe um parêntese para explicar que o real motivo da II Guerra foi a tentativa de destruição da URSS (União Soviética) que estava em ascensão econômica e exportava sua ideologia para vários países europeus. Na Alemanha, antes da guerra, por exemplo, estavam acontecendo várias batalhas dos Maximalistas, que eram grupos militares revolucionários comunistas, que tomaram e perderam o controle de diversas cidades no interior. Fenômeno parecido também estava acontecendo na Espanha. Os nazistas foram os que se comprometeram em ir até a URSS para destruí-la. Por isso, neste período, os nazistas foram financiados pelos EUA, pela Inglaterra, França etc. Mas no caminho tinha uma pedra, tinha uma pedra no caminho: a Polônia. E também porque o grande aliado, o nazista, estava descumprindo os acordos e crescendo mais do que o combinado. Não vou me estender mais sobre os motivos da II Guerra. Isto é apenas para mostrar que já estava em jogo, naquele momento, a hegemonia Unipolar da Ordem Mundial.

Este período unipolar só começou a se desestabilizar quando a URSS alcançou padrões de desenvolvimento e influência capazes de competir economicamente e militarmente. A Rússia não era grande exportadora de manufaturados, mas tinha conseguido sair das dificuldades das suas guerras civis e começara a desenvolver seus setores primários e secundários. Já conseguia dar conta do seu mercado interno que passara por más situações devido ao isolamento político e econômico. Como a URSS sempre teve ao redor de suas fronteiras, permanentes bombardeios, acabou desenvolvendo uma indústria bélica de ponta para garantir sua integridade. A história da Rússia, mesmo antes de se tornar a URSS, sempre foi de conflitos para garantir seu gigantesco território. Por ali passaram vários impérios que conquistaram e perderam parte do seu território. A região da atual Ucrânia passou por estas situações.

A URSS não era uma potência econômica, mas já a segunda maior potência militar do planeta. E com um projeto político independente e diferente do seu opositor, os EUA.

Ordem Bipolar mas ainda com a hegemonia dos EUA

A URSS estava em período de crescimento, mas bem mais lento do que a economia pujante norte-americana, que era capaz de liderar os outros países, inclusive os europeus.

Os EUA também tinham uma doutrina que os ajudavam a ampliar suas zonas de influência: a Doutrina Monroe, que estabeleceu que os EUA tinham uma posição contrária ao re-colonialismo europeu, MAS tinha como princípio de base que os EUA assumissem simbolicamente o papel de líder. Um fundamento (porta aberta) para o processo colonialista do continente latino-americano.

Esta doutrina se ampliou e variou de tal forma que deu fundamento para que os EUA se lançassem no processo de colonização em todo o mundo e não apenas na américa-latina. Então, várias invasões territoriais foram realizadas em prol dos interesses norte-americanos. Os europeus quase não reclamavam porque já o faziam na Ásia e na África. 

No cinema os americanos viviam maravilhosos romances na África e férias divertidas na Turquia. A geração que antecedeu a minha (tenho 66 anos), se divertiu muito com estes romances e comédias hollywoodianas, sem saber qual era o trágico pano de fundo histórico.

Mas nem tudo agradava aos parceiros europeus dos EUA. Na década de 70 os europeus aventaram criar o seu bloco econômico para alterar a hegemonia dos EUA na Ordem Mundial. Tentaram criar uma zona econômica européia. Queriam trocar suas reservas em dólar pelo ouro que os havia lastreado. Mas o poder bélico e econômico dos EUA foi capaz de alterar as regras e, em 1979, o lastro do dólar passou a não ser mais o ouro, mas o petróleo, que tem valor variável. A tática europeia não deu certo, mas ali se começou a estruturar uma alternativa para a atual Ordem Mundial, a criação da Comunidade Européia com uma moeda e um parlamento próprios.

Enquanto isso a URSS crescia, já exportava e tinha vários parceiros comerciais, muitos deles europeus. A Ordem começava a virar desordem para os EUA.

Guerra híbrida

O crescimento da URSS já começava a ser uma ameaça de fato. E já não dava para mandar navios e aviões para ficarem bombardeando as costas soviéticas, pois os soviéticos  já estavam armados até os dentes. Muito menos fazer ataques por terra, pois eles já tinham uma das maiores infantarias do mundo. Não dava para aglutinar os europeus contra a URSS, pois vários países faziam negócios ou eram sócios.

Mas os republicanos americanos tiveram uma ideia “semi-bélica” que não precisava disparar nenhum tiro: a corrida armamentista. Para cada arma que os americanos inventavam, para atacar a URSS, esta tinha que gastar fortunas para fabricar armas defensivas. Com isto, a corrida alterava os investimentos da URSS de bens de consumo e desenvolvimento para fabricação de armas. É como se duas pessoas lutassem debaixo d’água sem aqualung. Quem tiver menos fôlego morre. E realmente esta política teve efeito. A economia da URSS declinou, houve crise e culminou com a queda do Muro de Berlim e a desestruturação da URSS. 

Foi um período quase que de Ordem Unipolar, pois a URSS estava enfraquecida e a Europa ainda engatinhava na construção da Comunidade Européia, que sempre teve dificuldades internas e nunca conseguiu uma boa unificação.

Os EUA estavam surfando na sua ampliação hegemônica, mesmo enfrentando as crises estruturais naturais do capitalismo. Mesmo o mundo tendo aumentado o nível de miséria, estavam acumulando cada vez mais capital.

Também dava tranquilidade aos EUA o fato de que a Rússia sempre teve conflitos seculares com a China, que era um dos seus grandes parceiros. A China crescia, e dentro dela haviam várias empresas americanas, que fabricavam seus manufaturados Made in China.

Mas a realidade foi se modificando e a China tornou-se também uma potência comercial, tecnológica e militar. Seu crescimento estava mais rápido do que os seus trens balas, suas naves espaciais e seus foguetes intercontinentais. Aí começou o estado de depressão.

Que comunistas são estes com tantos empresários e milionários?

A China cresceu em 60 anos mais que os países europeus, que são seculares, e os próprios EUA. Um país onde as eleições são comunistas, cujo parlamento maior, o Congresso Nacional do Povo, também é composto por comunistas, mas que todas as empresas são privadas. Pode soar estranho, e é para o ocidente. 

Apesar do sistema político pressupor que a política econômica é criada pelo Estado, na realidade nem o Estado é capaz de interferir nelas. A China baseou seu desenvolvimento em rígidos planejamentos de pequeno, médio e longo prazos. O que aqui discutimos como “fazer gestão” e estamos aprendendo que isso é fundamental, lá na China faz parte do dia-a-dia das pessoas e do Estado. Um projeto de longo prazo não pode ser alterado antes que seja concluído, nem pelo Estado. O país é grande demais e não existem mecanismos de controle, a não ser o planejamento e execução. Isto eles chamam de “política de projetamento”. 

A China se tornou a maior ameaça comercial aos EUA. Também não dá para ameaçar militarmente nem boicotar sua economia, pois, como já disse, muitas empresas norte-americanas estão lá. A China também é a maior compradora de bens americanos. Se ela decair, as vendas norte-americanas também cairão, afetando a balança comercial.

É uma sinuca-de-bico. Tanto para a China quanto para os EUA interessa que comprem e vendam entre si.

Em 2017 a China anunciou um investimento de cerca de 70 bilhões de dólares para a criação da Nova Rota da Seda. 
Assim como a Primeira Rota da Seda, esta também abre a maior perspectiva de integração comercial dos últimos séculos.

É uma rede de negócios envolvendo um comércio trilionário, que tem por traz uma infraestrutura de diversos modais de transporte e até monitorização do espaço, via satélites. Atualmente atinge cerca de 4 trilhões de dólares em negócios!

O que foi um negócio que começou na Ásia, agora já está se estabelecendo em quase todos os continentes. Chama-se Projeto Eurásia. Um projeto que está unindo países historicamente conflitantes, como Rússia e China, e já encontra-se em funcionamento e circulando na maioria dos países da Europa. 

A China também vem ocupando o cenário internacional com um modelo de negócios diferente dos habituais do ocidente. Em geral, a cartilha do FMI e as instituições financeiras internacionais pregam a recuperação econômica, através de empréstimos, cuja garantia de pagamento são a venda de passivos destes países que se endividam. 

A China faz empréstimos a juros bem mais baixos desde que os devedores adquiram produtos e serviços das empresas chinesas. É um modelo onde os devedores não colocam em risco seu patrimônio e conseguem transferência de tecnologia e geração de emprego. 

A Argentina está fechando um acordo com a China para desenvolvimento de uma planta de energia nuclear e a ampliação de sua infraestrutura. 
Este tipo de negócio está fazendo com que vários países procurem fazer negócios com a China e não com a Europa e EUA

Durante o último governo dos republicanos a estratégia foi de forçar os aliados, inclusive europeus, a não fazerem negócios com a China. Deu certo até certo ponto, pois quem deixou de fazer negócios com a China deixou a oportunidade para os EUA. 

No Brasil aconteceu exatamente isso. O governo brasileiro atuou mal diplomaticamente, deixou de vender uma boa quantidade de commodities. Os EUA acabaram fazendo este negócio no lugar do Brasil…. 

Agora a Nova Ordem Mundial já não é mais bipolar e já tem os olhos puxados. 

Guerra como instrumento político-comercial

Com a eleição do Partido Democrata, que nos EUA é conhecido como o Partido da Guerra, a tática mudou. Voltamos a ver um mundo belicista. A estratégia recorrente deles é destruir militarmente seus maiores adversários, custe o que custar. Eu já havia previsto isto no meu artigo “O que ganhamos com as eleições americanas” de 14/11/2020. 

Os membros do Partido da Guerra invadiram a Líbia, o país mais rico e independente da África, assassinaram e decapitaram o presidente e exibiram na imprensa. Invadiram o Iraque, financiaram Bin Laden e os traficantes de heroína, fomentaram a guerra na Síria, promoveram o genocídio no Iêmen e muito mais. Mas tudo deu errado. 

Perderam quase todas as guerras e recentemente saíram correndo do Afeganistão, inclusive deixando grande parte dos seus armamentos por lá. Nos EUA este foi considerado o primeiro grande vexame do atual presidente.

Um dos grandes objetivos é a intimidação belicista. Este é o papel do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Há um acordo celebrado com os EUA, na época do governo Gorbachov, de não proliferação da OTAN. Os EUA não cumpriram o acordo. Nos últimos anos a OTAN se estendeu de forma extraordinária na direção do território russo. E chegou às suas portas.

Ucrânia e as ações da CIA e União Européia

Esta região que atualmente se chama Ucrânia foi um território ocupado por diversos povos. No século V foram os eslavos, no século IX foram os vikings e escandinavos. Juntos com os eslavos formaram o Reino de Rus. Há um espírito cultural forte de ali ter brotado a Rússia. Em 1920 esta área foi unificada com o nome de Ucrânia, uma terra muito fértil, até hoje. 

Na Ucrânia há grandes plantações de trigo que é exportado para muitos países. Cinquenta por cento da população fala russo e boa parte de seus cidadãos tem dupla cidadania. 

Os EUA e União Européia usaram seus serviços de inteligência  para instigar a “Revolução Laranja” cujo objetivo era trazer a Ucrânia para uma aliança com o ocidente  (assim divulgou a agência Norte-americana de inteligência). Mesmo assim, em 2004, as eleições ucranianas foram vencidas por Viktor Yanukovych. A Ucrânia tem uma oligarquia que tenta apropriar o Estado em seu favor, deixando a população com o conhecido “Estado Mínimo”.

A partir daí as ações dos EUA e União Européia se intensificaram e tentaram desestabilizar o governo eleito ucraniano. 

Em 2014 a União Européia (UE) tentou fazer acordos a partir de parcos financiamentos que não foram realizados, pois a Rússia estava bem financeiramente e ofereceu bilhões em investimentos. Mais uma derrota dos EUA e UE, que não desistiram da disputa pela Ucrânia. 
Deram um golpe conhecido como Revolução Maidan, bancada pelo governo Obama.

Daí em diante as atuações dos EUA e UE contaram com grupos nazistas da Galícia. Houve ocupações em Kiev com tumultos e tiroteios. O nazi-fascimo tomou conta da Ucrânia, houve muita perseguição e morte e o oligarca Petro Poroshenko foi declarado vencedor desta eleição violenta e fraudulenta. 

Aqui no Brasil, recentemente, vimos em algumas  manifestações estas bandeiras ucranianas usadas pelos grupos de ultradireita e que tremulavam em plena avenida paulista.
Por incrível que pareça, foi a torcida do Corinthians quem os enfrentou.

Voltando à Ucrânia. Depois desta eleição, a extrema-direita no poder, proibiu o uso da língua russa na Ucrânia. Toda a oposição foi violentamente reprimida e muitos se abrigaram em Lugansk e Donetsk. Mesmo refugiados nestas regiões, muitos membros de partidos de esquerda e sindicalistas foram perseguidos e assassinados pela extrema-direita nazi-fascista. 

Nas últimas eleições ucranianas o ator Volodymyr Zelensky, um comediante de televisão, sem nenhuma experiência política, refém da extrema-direita nazi-fascista, se elegeu com uma pauta anti-política e fascista. 

Voltando à Ucrânia. Depois desta eleição, a extrema-direita no poder, proibiu o uso da língua russa na Ucrânia. Toda a oposição foi violentamente reprimida e muitos se abrigaram em Lugansk e Donetsk. Mesmo refugiados nestas regiões, muitos membros de partidos de esquerda e sindicalistas foram perseguidos e assassinados pela extrema-direita nazi-fascista. 

Nas últimas eleições ucranianas o ator Volodymyr Zelensky, um comediante de televisão, sem nenhuma experiência política, refém da extrema-direita nazi-fascista, se elegeu com uma pauta anti-política e fascista. 

Assista ao vídeo de campanha de Zelensky . Ele é parte do filme onde interpreta um professor que acidentalmente se tornou presidente e venceu as eleições. Dá para ver bem quem ele é e o que representa.

Como saber quem está em vantagem

No jogo de xadrez o grande objetivo inicial é dominar o meio, as quatro casas centrais. Quem não dominar levará muita desvantagem ao longo do jogo. E para isto joga-se o jogo-posicional. Os principiantes sempre se aventuram e fazem jogadas perigosas. Só ganham de outros principiantes. Se jogarem com alguém um pouco mais experiente vão perder. Não imaginam que o adversário verá as suas intenções.

Os mais experientes jogam o jogo posicional, que é mais lento e que tenta imaginar mais que cinco jogadas à frente, tanto dele quanto do adversário. É preciso ter calma, experiência e capacidade de abstração. 
Pode não parecer, mas depois do décimo lance podem ser jogadas mais de um quatrilhão de variantes. 

E existe uma dificuldade que só a experiência é capaz de fazer: olhar para um tabuleiro e dizer quem está em vantagem. No xadrez só se deve movimentar uma peça depois de toda esta reflexão e concentração. 

Na política e na guerra as regras são iguais às do xadrez. E por isso mesmo vamos ver a dificuldade de analisarmos como será a próxima Ordem Mundial.

O blefe irresponsável de uma política irresponsável

Há uma velha frase político-militar que diz que você não deve ir para uma posição que não possa sustentar, e muito menos, levar outros consigo.

 Isto é o que o Partido da Guerra está fazendo neste momento.Pressionou o ator-presidente a permitir a instalação de bases da OTAN no nariz da Rússia. Prometeu total apoio. Se a Rússia se manifestasse os EUA e a UE dariam as respostas que garantiriam a continuidade da instalação.

Mas a Rússia já previa isto há alguns anos, já que vinha tentando negociar o não avanço da OTAN com os ouvidos surdos dos EUA e UE. 
Diante da quebra do acordo e do avanço da OTAN, a Rússia se preparou, econômica e militarmente. Os EUA e UE apenas blefaram.

A Rússia acumulou mais de 600 bilhões de dólares em suas reservas caso tivesse que passar por sanções econômicas. Fez parceria com seus países vizinhos, inclusive a China para continuar fazendo negócios. Isto significa que as ameaças de sanções não vão influenciar tanto nas decisões russas.

O gás europeu é fornecido majoritariamente pela Rússia, que é autossuficiente de fontes energéticas de hidrocarbonetos e outros. Pode prescindir de importações.

A Rússia tem hoje um grande estoque de mísseis hipersônicos, enquanto os EUA ainda não conseguiram produzir nenhum e está em muita desvantagem. É necessário mais de dez anos para se conseguir colocar em funcionamento um míssil hipersônico. A Rússia tem obviamente o apoio militar da China. 

Isto significa que não haverá uma grande guerra. Todos têm arsenal atômico para destruir o planeta. Ou seja, ninguém vai apertar o botão vermelho. 

Os EUA blefaram e isto está refletido na gagueira e exitação do seu presidente, que antes da crise já havia perdido credibilidade em seu país. Deixaram o presidente da Ucrânia solitário em seu camarim, com pavor de ter que abrir as cortinas. O público foi embora e já não tem mais o que interpretar. O show acabou. 

A Rússia invadiu a Ucrânia sabendo que os EUA estavam blefando, que não iam fazer nada. Como dizem hoje os republicanos nos EUA: “o presidente não fez nada e foi dormir”.

Enquanto isto, o presidente da Rússia justificou a invasão em prol da garantia de defesa do território russo.

Assista a entrevista do presidente Putin para a imprensa internacional.

Não poderíamos chamar de um erro de principiante, pois os Democratas do Partido da Guerra perderam quase todas as suas guerras. É uma burrice recorrente.

Agora os EUA perderam mais ainda seu espaço na atual Ordem Mundial e levaram juntos, por enquanto, vários países. 

Há uma frase que diz que diplomacia é afagar o cachorro com uma mão enquanto pega a coleira com a outra.  Países não são amigos, têm interesses provisórios que os unem.

A Nova Ordem Mundial

Há uma lei universal que diz que não existe vácuo na política. Ele sempre estará ocupado.

A precipitação imatura e despreparada dos EUA vai provocar uma nova correlação de forças militares, econômicas e políticas. 

A Rússia está em plena fase de crescimento e detentora de importantes fontes de energia e commodities. É uma das maiores potências militares.

A China está se dirigindo para ser a maior potência econômica do mundo até o final desta década. E está tentando alavancar a América-Latina, África (um continente abandonado pelos EUA e UE) e Ásia, formando um bloco econômico alternativo.

A UE e os EUA têm economias poderosas e não vão se subordinar a outros modelos políticos e econômicos.  Mas devem ter que negociar novas formas de relacionamento com o mundo.J

_________________________________________________

Já dá para começar a refletir sobre como será esta Nova Ordem Mundial.

Vamos ficar diante do tabuleiro e analisar, pois agora ela já se tornou uma Ordem Multipolar.

Capitalismo Internacionalista x Capitalismo Nacionalista

(por Leon Ayres em 23/02/2022)

Onde este conflito vai nos levar?

Esta é a pergunta que deve nos levar a uma discussão sobre para onde vai o capitalismo que já se tornou internacionalista, mas que gera internamente uma reação nacionalista. Isto é um conflito ou um paradoxo?

Os Estados Unidos em primeiro lugar!

Esta frase, proferida pelo ex-presidente Donald Trump, pode parecer que significa que os interesses dos EUA devem se sobrepor a qualquer outro. Mas não é apenas isso. 

Vou trazer para a discussão o que considero como sendo o verdadeiro significado e que explica outros movimentos políticos como, por exemplo, o Brexit.

Espero que ajude na compreensão sobre o aumento dos movimentos nacionalistas, conservadores, de direita e extrema-direita, assim como alguns fatos que estamos vendo e muitas vezes não entendendo. 

Não estou pretendo fazer algum juízo de valor, mas apenas despertar em cada leitor um olhar mais apurado e crítico.

O crescimento do capitalismo internacionalista

Este fenômeno não é atual, já acontecia no início da década de 30. Só que agora atingiu uma dimensão muito maior que no passado.

Hoje em dia há empresas que têm um capital maior do que o PIB (Produto Interno Bruto) de vários países. Mais do que alguns juntos! São grandes corporações que operam e estão distribuídas em vários países. 

Pode parecer exagero, mas o renomado analista americano de política e economia, Thom Hartmann, calculou que estas corporações têm capital acumulado de mais do que 20 vezes o PIB de todo o mundo! Isto para comprar à vista.

Estas corporações são maiores do que tudo que se possa imaginar e não estão submetidas a nenhuma legislação que as controle. Muitas têm sedes em paraísos fiscais e não pagam os tributos regulares dos países de origem. Não são punidas e influenciam os países onde seus capitais estão circulando. Influenciam mais do que os seus próprios países. Muitos dos seus donos, ou maiores acionistas, nem moram onde criaram suas empresas, mas em todo o mundo. 

As fronteiras das suas nações não estão contidas nos seus países de origem. 

Mas isto não nasceu recentemente. Após a crise de 1929, muitas empresas quebraram, muitos bancos faliram e houve muito suicídio por isso. Mas foi o período onde se formaram as grandes fortunas norte-americanas. Alguns banqueiros e empresários continuaram vivos, enriqueceram e se expandiram internacionalmente. Não como agora, mas da mesma forma, através dos mesmos métodos de atuação.

O capitalismo nacionalista

O desenvolvimento do capitalismo internacionalista gerou problemas internos em diversos países onde essas corporações se originaram. No capitalismo o crescimento do capital é fundamental para a sua sobrevivência e existe uma concorrência ferrenha entre as empresas. Quem enfraquecer, ou permanecer do mesmo tamanho, será engolido pelos mais fortes. Então, crescer está acima do que os compromissos com seus países.

Nestes momentos, quando os compromissos das empresas não estão vinculados aos seus países, crescem movimentos políticos, de base ideológica nacionalista, com a intenção de resolver este problema. Historicamente, os mais fortes deles são os movimento de direita e extrema-direita (faço esta distinção por causa dos movimentos ditos conservadores, os fascistas e os nazistas).

Dentro do campo atualmente denominado de esquerda (que cada vez está mais difícil de ser caracterizado) existe um brando viés nacionalista, mas que não tem propostas político-econômicas para fazer frente a estas corporações. Muitas vezes têm até que se curvar a elas para conseguir governar. 

Em algumas situações a socialdemocracia dos países em desenvolvimento faz algumas atuações em prol das suas empresas nacionais, pois visa a melhoria das condições dos trabalhadores. 

Nos movimentos socialdemocratas e trabalhistas, democratas cristãos etc., são tênues as atuações junto aos conflitos entre o capitalismo nacionalista e o internacionalista. Principalmente em países ricos. A socialdemocracia está no campo da conciliação de classe, das melhorias para a classe trabalhadora e do pacto social. Nestes países ricos existe uma vulnerabilidade das empresas nacionais frente às internacionalistas. 

As empresas internacionalistas estão distribuídas em vários países, com várias sedes, com várias razões sociais e estão acima das regras que as empresas nacionais têm que seguir.

As empresas nacionais não conseguem sobreviver diante de regras que não favorecem à sua existência, muito menos ao seu crescimento. Um comerciante local cumpre as regras do local onde sua empresa foi criada. Se for cumprir regras internacionais corre o risco de não conseguir sobreviver. 

Vou dar um exemplo bem simples de um empresário tradicional que sobrevive em seu país cumprindo as regras locais. Suas mercadorias atendem aos padrões locais, cumpre a legislação local, emprega funcionários locais etc. 

Eis que agora ele tem que ter  um padrão ou certificado internacional para produzir e vender suas mercadorias. Seus produtos vão ficar mais difíceis de serem manufaturados, ficarão mais caros e encontrará uma série de outras dificuldades. As empresas internacionalistas vão exportar as mercadorias delas para os clientes dele, que vai diminuir sua lucratividade, vai demitir funcionários e possivelmente falir. Esta situação está acontecendo em vários locais.

Vimos recentemente algumas situações em alguns países que nos foram difíceis de entender.

Há dois bons exemplos que ilustram o que estou dizendo.

O Brexit

A Inglaterra entrou na Comunidade Européia e se adequou às regras do bloco. Foi bom para as empresas internacionalistas, pois também abriram seus mercados. Mas trouxe um grande transtorno para os pequenos, médios e grandes empresários ingleses. 

Na Europa, a Comunidade Européia estabelece as regras comerciais para os países que compõem o bloco. Ou seja, algumas das maiores empresas internacionalistas européias. Algumas inglesas e a maioria alemãs.

As grandes corporações inglesas se beneficiaram, mas os empresários locais não. Muitos quebraram, muitos empregados tiveram que ser demitidos e o tradicional e secular orgulho inglês caiu na angústia e depressão. Começou um grande movimento de descontentamento.

O movimento acabou desembocando na proposta de saída da Inglaterra da Comunidade Européia. Funcionando ou não, esta tática mostrou a alternativa da direita para esta situação. O nacionalismo arrebanhou adeptos, cresceu e as outras linhas políticas ficaram apreensivas.

O fenômeno Trump

Quem imagina que o ex-presidente ganhou as eleições por causa das redes sociais, se enganou. 

Nos EUA estão localizadas as maiores corporações do planeta. Estão em todos os setores das atividades humanas e distribuídas em todos os países. Até no seu grande rival comercial, a China. Está cheia de corporações norte-americanas vendendo produtos Made in China. Nos EUA estão as matrizes, mas nem sempre. A maior parte dos seus capitais está fora, pagando menos ou nada de impostos.

Assim como na Inglaterra, as grandes corporações não sofreram, como as pequenas, médias e grandes empresas exclusivamente americanas. Da mesma forma, do que na Inglaterra, muitas empresas quebraram, muitos empregados foram demitidos e o orgulho norte-americano decaiu. 

A situação interna também piorou por causa da sua falta de capacidade de rápida recuperação econômica pós-crise de 2008. Os EUA quando saem de uma crise, quase sempre, crescem cerca de 4% ao ano. Desta última vez se penduraram em um mísero 2%. Ou seja, cresceram apenas a metade, ou pensando de outra forma: encolheram.

No interior dos EUA este cenário foi o pior. O padrão de vida das pessoas e das empresas locais quase que despencou. Assim como na Inglaterra surgiu um grande movimento de descontentamento e também cresceu o nacionalismo. Este foi o eleitorado que fez a diferença nas eleições, e não o desempenho das redes sociais. Não é a propaganda que ganha as eleições, mas a base política. E esta foi a base do ex-presidente.

A frase “America first” (EUA em primeiro lugar) foi um recado de campanha eleitoral para as grandes corporações norte-americanas, cujas fronteiras nacionais não mais estavam no seu país de origem. E esta frase aglutinou os nacionalistas norte-americanos e a extrema-direita.

A direita e extrema-direita americana ajudaram a alavancar a campanha de um despreparado, mas carismático falastrão. Há de se lembrar que até ator de cinema foi eleito presidente apoiado pelas extrema-direita norte-americana e alemã (que ainda existem e atuam nos dois países). A família Koch Brothers, por exemplo, uma das mais ricas dos EUA, de extrema-direita, racista, teve papel importante no financiamento da campanha do ex-presidente. 

Trump e os Koch Brothers durante a campanha

Quem viu o filme “Infiltrado na Klan” viu as cenas reais da atuação da Koch Brothers em uma manifestação.

Onde estão as fronteiras e de que lado estou?

Boa pergunta. Agora o artigo continua nos seus pensamentos e nas suas conclusões. Discutir é o mais importante!

Sobre o conflito da Rússia e Ucrânia

O fim da guerra fria

Para entender esta nova Guerra Fria precisamos voltar à primeira, após a queda do Muro de Berlim. 

Com a queda do Muro de Berlim houve uma grande reviravolta na economia da antiga União Soviética. Foi o período da Glasnost iniciado no governo de Mikhail Gorbachev.

Foi o início do liberalismo na União Soviética, que já era denominada Rússia.  A partir daí houve um verdadeiro colapso na economia. Muitos setores, como a  indústria e o comércio, foram praticamente paralisados. Naturalmente o desemprego disparou. 

O Sistema de Saúde foi sucateado e o Sistema de Proteção Social foi completamente destruído. Um verdadeiro colapso. Milhões de pessoas chegaram à linha da miséria.

As forças armadas também ficaram em condições deploráveis. Não era incomum, naquela época, vermos ex-militares traficando aviões de caça, que eram trazidos desmontados em aviões de carga civis. Tivemos um caso desses aqui mesmo no Brasil.

O bêbado equilibrista

Seguiu-se ao fraco governo de Mikhail Gorbachev o fraquíssimo governo de Boris Yeltsin. Um fantoche digno daqueles apresentados no desfile de carnaval pela Escola de Samba da Mangueira, em 2020.

Não foram apenas dez vezes que o presidente Boris Yeltsin apareceu em público completamente embriagado. Em algumas dessas aparições, ele teve que ser amparado pelos seus seguranças, para não cair no chão, alcoolizado.

Um homem que foi colocado pelo liberalismo ocidental para usar a pá-de-cal e enterrar a composição do grupo de países que compunham a antiga União Soviética.

O Partido Democrata, norte-americano, ou o Partido da Guerra, como é conhecido nos EUA, e os financistas da Wall Street, jogaram suas fichas para desestruturar a economia russa.  

Nesta tentativa de desconstrução da economia russa, sofreram bastante aqueles países que se beneficiaram da antiga União Soviética. Eram os mesmos, os direitos sociais e econômicos daqueles países. Com a desvinculação dos países que compunham o bloco, 25 milhões de pessoas tornaram-se estrangeiras da noite para o dia e passaram a ter direitos diferenciados.  Foi uma das maiores catástrofes sociais do Século XX. 

Em 1993, os deputados do parlamento russo se posicionaram contra a política de Boris Yeltsin, que mandou tanques dispararem contra o prédio do parlamento com balas que atingiram vários escritórios. Foram muitas manifestações populares e verdadeiras batalhas nas ruas com centenas de mortos. Bill Clinton se pronunciou dando total apoio a Yeltsin. Afirma Clinton: “Os Estados Unidos continuam firmes no apoio ao presidente Yeltsin”.

A política de Yeltsin-EUA estava dando resultado. Mas a situação caótica deu início a várias guerras civis por causa das diferenças e falta de uma política unificadora. Yeltsin renuncia em 1999.

A reviravolta russa

A partir do ano 2000 iniciou-se o governo Putin e a economia russa tomou outros rumos. O governo que se seguiu não tinha mais a linha soviética de atuação política e econômica. A Rússia começou a mudar, mas fora do campo liberal do ocidente. A Rússia começou a cuidar de si.

Uma das linhas de desenvolvimento passava pela pesquisa e Intensificação da indústria (tecnológica, eletrônica, petroquímica, agricultura etc.). Algo óbvio para qualquer tipo de governo que queira desenvolver o seu país.

Investiu em uma privatização mais equitativa sobre o controle de Estado. Algo que também é óbvio para qualquer tipo de governo. Nem os EUA, nem os europeus, nem as potências asiáticas abrem mão do controle do Estado sobre a economia. Se não vira quintal do sistema financeiro.

Quais foram os resultados dessa política:

  • Aumento do PIB;
  • Reforma das forças armadas;
  • Privatização mais equitativa, mais justa (estatais não foram vendidas “de graça”);
  • Encerrados os esquemas de formação de oligarquias (criação relâmpago de bilionários);
  • Estado tomou a responsabilidade pelas indústrias estratégicas;
  • Propriedades foram preservadas,, pois havia leis para protegê-las;
  • Empresas tiveram que assumir responsabilidades sociais;
  • A maioria dos empresários toparam,se  adaptaram e se sentiram mais confortáveis. Quem não ficou satisfeito: bilionários que enriqueciam, não por seus talentos empreendedores, mas pela capacidade de forçar o Estado a dar-lhes privilégios; 
  • Redução da taxa de pobreza em 2/3;
  • Aumento das pensões para idosos.

Em 2004 Putin foi reeleito com 70% dos votos. Ao longo do governo Putin a renda média subiu de 700 rublos (2000) para 29.000 rublos (2012). Ou seja, 4.142,85% (41 vezes). 

A Rússia quitou todas as suas dívidas de todas as repúblicas que compunham a antiga União Soviética, fato aprovado até pelo FMI. A dívida da Ucrânia era de US $16 bilhões.

Tudo isto atrapalhou os negócios financistas da Wall Street na Rússia. A política liberal ocidental começou a sentir cansaço na sua caminhada. Estavam perdendo o controle. Agora só restavam as guerras localizadas.

O governo dos EUA apoiou Bin Laden e Al-Qaeda contra a Rússia. O diretor da CIA no governo Reagan,  fez esforços para incitar os muçulmanos no Cáucaso (Ásia Central) contra a Rússia. O plano iria além de derrotar a Rússia no Afeganistão. Era tentar derrubar o regime. O plano, explícito, dos EUA continuou na Chechênia. No governo Bush houve apoio financeiro-militar, confirmado pelo próprio Bush . 

Mas a frágil e trágica estratégia americana fez com que seus aliados se tornassem inimigos, chegando a derrubar um dos seus maiores símbolos: as duas torres gêmeas…

Em matéria de política externa os EUA seguem a estratégia do “Tiro, Porrada e Bomba”. A tática atual é tentar obrigar os europeus a um novo enfrentamento mundial.

E o vento levou…

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) nasceu em 1949 para proteger o mundo contra a expansão comunista. Para se contrapor à OTAN, o bloco socialista criou o Pacto de Varsóvia. Foi o início da Guerra Fria.

Com a unificação da Alemanha (queda do Muro de Berlim) acordou-se que a atuação da OTAN não avançaria mais do que as fronteiras da Alemanha. Este foi um acordo verbal no período de Mikhail Gorbachev. Ou seja, as palavras o vento leva…

E o vento levou. Apesar de não haver mais nenhum conflito que caracterizasse a Guerra Fria, a OTAN veio avançando sobre a fronteira das antigas Alemanhas.

Há, desde o governo Clinton, um aumento considerável de investimentos militares. O Partido da Guerra investe pesado na sua maior arma de convencimento, apesar do jeito simpático dos seus grandes líderes.

Enquanto a Rússia investiu US $40 bilhões, os EUA chegaram a US $460 bilhões em 2016 durante o governo Obama. A simpática e bélica Hillary Clinton fez aumentar os investimentos militares em favor da intervenção na Síria, uma das suas guerras mais recorrentes. A soma de todo o investimento militar mundial é de US $600 bilhões.

Nos períodos dos governos do Partido da Guerra, o Pentágono considera a Rússia como a maior ameaça aos EUA.

A verdadeira ameaça

A verdadeira ameaça aos EUA gesta em suas próprias entranhas, assim como o Alien, o oitavo passageiro. A grande ameaça é sua economia que encontra-se em declínio há bastante tempo, há algumas décadas. 

Do ponto de vista externo os EUA estão diante do surgimento do Projeto Eurásia, com a criação da Nova Rota da Seda. Este é um dos maiores empreendimentos comerciais da história da humanidade e está conseguindo unir antigos rivais, como a China e a Rússia. 

A Nova Rota da Seda movimenta bilhões de dólares em uma rota comercial que se iniciou na Eurásia Central e se espalha por todo o mundo. Esta é a grande ameaça externa dos EUA. É rota de passagem esta região  onde encontram-se países que circundam o Mar Negro e Mar Cáspio. Com certeza é o alvo do Partido da Guerra através da sua tática de “Tiro, Porrada e Bomba”. A Ucrânia é um local taticamente importante e alvo de atividades geopolíticas comerciais. Quem dominar aquela área levará vantagem. 

Por isso, não imaginemos que este aparente conflito na Ucrânia se explique com estas notícias novelescas de defesa da democracia, aumento de terras ou mesmo problemas psicológicos de governantes.

Também não vamos deixar de levar em consideração que a China, que antes era quase que inimiga da Rússia, é a grande idealizadora e maior investidora da Nova Rota da Seda. Se a guerra acontecer, ela vai participar. Poderá ser uma guerra maior que todas as outras juntas!

A carta de Putin a Xi Jinping: "Rússia e China: uma parceria estratégica  orientada para o futuro" - SIC Notícias

Nem os ucranianos nem os europeus estão interessados neste conflito, pois todos estão se beneficiando desta nova rota comercial. 

Neste momento, o presidente Zelensky, que também é comediante, está tentando fazer o melhor roteiro possível para lidar com o pior drama na vida dos ucranianos.

Países não são amigos ou inimigos, eles têm interesses comuns e conflitos comerciais. Por estes conflitos comerciais eles vão à guerra, mas contam outra historinha para justificarem seus atos. 

Espero que o mundo não siga o desespero de um império que está se esgotando. O Império Romano passou por isso e os senhores feudais também. 

Toda crise gera oportunidades e nesta há a possibilidade de mudança de uma nova ordem mundial. Pense sobre a ordem mundial que você gostaria de ver. 

Como dizia Ariano Suassuna, “só nos resta tentar ver as coisas com realismo, pois o pessimista é um chato e o otimista um tolo”.

As novas guerras na nova Rota da Seda

Por Leon Ayres em 03/02/2022

Saiba o verdadeiro motivo dos conflitos na Ucrânia e países próximos do Mar Cáspio e Mar Negro. Mas para entender teremos que voltar um pouco na história, no início da Rota da Seda. Ela ressurgiu e é a maior ameaça comercial para os EUA.

A Primeira Rota da Seda

A Primeira Rota da Seda surgiu mais ou menos no Século II a.c. Eram duas rotas que eram usadas inicialmente para o comércio da seda chinesa, mas foi se ampliando e outros produtos também foram comercializados. Eram caravanas e embarcações oceânicas que faziam o transporte de mercadorias entre a Ásia e a Europa. 

Mas não era uma rota segura, haviam muitos piratas e ladrões. Em 1271, com o estabelecimento do Império Mongol a Rota da Seda tornou-se muito mais segura e ampliou-se de forma extraordinária.

A rota marítima ainda não tinha se desenvolvido naquele momento. Esta rota foi bastante disputada, inclusive pelos europeus, que utilizaram o mar para fazer “grandes descobertas” e “comércio nas Índias”. Agora dá para entender o que eram aquelas expedições portuguesas que estudamos nos nossos precários livros de história. O objetivo era a Rota da Seda, o maior empreendimento comercial. E ninguém se furtava a usar a força bélica para atingir seus objetivos. Agora podemos voltar aos dias de hoje.

A nova Rota da Seda

Em 2017 a China anunciou um investimento de cerca de 70 bilhões de dólares para criação da Nova Rota da Seda. Assim como a Primeira Rota da Seda, esta também abre a maior perspectiva de uma integração comercial dos últimos anos.

Nasce o Projeto Eurásia, com a participação comercial da China, Rússia e vários países do oriente médio, ou também denominada Eurásia Central. É o estabelecimento de relações comerciais bilionárias entre a Ásia e a Europa. 

A seda, neste caso, serve mais para criação de camisas do que seu principal produto de comércio. Assim também aconteceu na Primeira Rota da Seda. 

E no momento onde a economia norte-americana passa por determinado nível de declínio, a Rota da Seda é uma grande ameaça. Então, o que fazer?

Durante o governo republicano de Trump, a tática americana era de forçar seus aliados a não fazerem comércio com a China. Dá para entender porque o governo brasileiro começou a hostilizar o governo chinês e perder dinheiro com as exportações do agro-negócio. 

Nada havia nada de ideológico, mas apenas perder dinheiro para defender os interesses americanos. Esta tática americana não deu certo, pois vários países europeus continuaram a fazer “negócios da China”.

Com o governo democrata de Joe Biden a tática é bem diferente, e digamos, objetivamente bélica, fazendo guerras para encarecer o transporte de mercadorias ou inviabilizá-los. 

Parafraseando Carlos Drummond de Andrade: no caminho tem uma pedra americana. Mas terão que ser muitas pedras. A rota passa por muitos países. E como o Partido Democrático é conhecido nos EUA como o “Partido da Guerra” as soluções têm gosto de pólvora.

Vamos observar o mapa mais detalhado onde atualmente estão acontecendo as maiores tensões diplomáticas, iniciando uma nova Guerra Fria. Parecem guerras ideológicas, com objetivos nobres de defesa da liberdade e da democracia. Mas são guerras-de-rapina, onde o interesse é comercial. 

A Rota da Seda passa por países próximos ao Mar Cáspio e do Mar Negro. Vários destes vivem conflitos diplomáticos e bélicos como a Ucrânia, Kazaquistão, Turkemenistão, Afeganistão, Irã, Azerbaijão etc. 

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), que deveria ter sido extinta após a queda do Muro de Berlim, vem crescendo e se espalhando por esta região. O grande exemplo é o crescimento da OTAN na Ucrânia. 

Para justificar este avanço das forças militares da OTAN os EUA divulgam International Fake News, dizendo que a Rússia irá invadi-la, fato que os próprios ucranianos negam…

De agora em diante veremos muitos conflitos nesta região. O verdadeiro objetivo: dificultar ou destruir a Nova Rota da Seda.

Agora você já sabe. Não se iluda com o noticiário novelesco que trata estes conflitos como nobres guerras ideológicas. É desespero comercial mesmo!

Esta é apenas uma pequena introdução ao tema. Para aprofundar mais sobre este assunto pesquise o analista político internacional, Pepe Escobar. Foi nesta fonte que eu bebi.


O movimento reformista na democracia burguesa

(Leon Ayres – fevereiro/2021)

Ao final da II Guerra Mundial os países que estiveram na hegemonia da guerra contra o nazismo sentaram-se para fazer um grande acordo com diversos objetivos diferentes. O que eu quero ressaltar é a parte do acordo de conciliação política.

No caminho tinha uma pedra (ou no caminho tinham duas pedras e uma tentativa de acordo)

Ao final da II Guerra encontraram-se no meio da Alemanha os dois grandes inimigos: capitalistas e comunistas. Naturalmente deveriam se enfrentar nesta fronteira da mesma forma que vinham se enfrentando desde 1919. Mas o mundo não tinha mais condições de continuar uma guerra, pois o enfrentamento nuclear resultaria em mais uma grande catástrofe mundial.

Do ponto de vista político-econômico, tanto para os comunistas quanto para os capitalistas, o melhor seria evitar a guerra e tentar ampliar as suas fronteiras político-econômicas.

De imediato os capitalistas fizeram um gigantesco investimento para garantir a recuperação econômica de dois países importantes, do ponto de vista geopolítico: Japão e cerca de metade da Alemanha. A Rússia, na expulsão dos nazistas do leste europeu, tinha ampliando a sua zona de atuação em diversos países, construindo a URSS.

Desde a crise de 1929, principalmente na Europa, os comunistas fizeram várias tentativas de tomar o poder de forma insurrecional, como na Alemanha, França, Itália e Espanha, por exemplo. Para os capitalistas este acordo político tentava mitigar as ações destes grupos.

Para os comunistas o acordo visava a sobrevivência da URSS, que vinha sendo bombardeada ininterruptamente desde 1919. Também tentava garantir a sobrevivência dos partidos comunistas pelo mundo. Com este acordo os partidos comunistas mudariam suas atuações utilizando então as eleições burguesas para ascender ao poder governamental.

Luta-de-classe (ou briguinha-de-classe)

Sai a ideia de “revolução comunista” e entra a “eleição comunista”. Na Europa a adesão dos partidos comunistas foi significativa. Mas nem todos os partidos comunistas pelo mundo reafirmaram esta política conciliatória de sobrevivência. Muitos julgaram que alinhar-se à URSS poderia significar abrir mão de atuações políticas locais. Tornaram-se partidos comunistas não alinhados. Um partido alinhado pode acabar não podendo tomar decisões independentes, pois podem interferir nos interesses locais da URSS.

A luta-de-classes tem estágios diferentes. A luta-de-classes na Europa está em um estágio diferenciado da dos países “colonizados”. Então a luta política se dá de maneira diferente em cada local. A luta política insurrecional pode não ser um instrumento na Europa, mas sim nos países latino-americanos, africanos e asiáticos, por exemplo. O alinhamento tenderia a tirar a independência dos movimentos políticos locais em favor de uma política mais geral da URSS. E foi o que aconteceu.

As flores de plástico não morrem

As flores não nascem onde as condições não sejam favoráveis. Na eleição burguesa não há espaço para a revolução comunista. Afinal, qual é a tarefa de um governo constituído de comunistas para gerenciar uma economia capitalista?

Surge então a consolidação da ideia de construção política de reformas em etapas. Assim se daria a transformação de uma política econômica capitalista em uma política econômica comunista.

Surge o movimento comunista reformista que influenciaria diversas linhas políticas. Em função desta mudança de paradigma, algumas terminologias mudaram de significado: socialismo e socialdemocracia. Estes termos tinham significados políticos bem diferentes.

Progressistas?

A limitação de atuação dos antigos partidos comunistas levou o movimento popular a certo declínio. A luta política tornou-se mais eleitoral e com períodos definidos de acirramento. As regras de atuação passam a obedecer à preservação da própria democracia burguesa. Uma verdadeira “luta-sem-classe”.

E foi neste marasmo e vácuo político que cresceram os socialdemocratas, os socialistas, os trabalhistas e outras linhas que atualmente são denominadas “campo progressista”.

Neste início do Século XXI, a socialdemocracia ascendeu a governos na Europa e América Latina. Alguns se autodenominavam socialistas. Uma grande ilusão simbólica de emancipação da classe trabalhadora. Ao longo destes governos o tradicional abandono da luta-de-classes pela socialdemocracia criou governos conciliatórios que pareciam avançar a conjuntura, tal qual a ideia reformista.

Migalhas mínimas

Como não existe espaço vazio na política, no Brasil, a socialdemocracia também nasceu por causa da pouca atuação política dos partidos comunistas.

Elegeram seu presidente da república e construíram o seu projeto conciliatório. O movimento sindical e popular foi arrefecido para evitar constrangimentos ao governo. Programas de “bolsas-marmitas” traziam uma horda de novos consumidores às urnas, ao longo de mais de uma década.

Consumidores não são base ou militantes políticos. Arrefecer os movimentos faz parte do movimento conciliatório, tal qual vimos no acordo entre os capitalistas e comunistas após a II Guerra. Acaba minando as próprias forças populares que são os agentes e beneficiários do avanço social. O que vem em seguida é um governo fascista que se aproveita da fraqueza da socialdemocracia. No final das contas o Reformismo devolve à burguesia os seus direitos originais no capitalismo.

No caminho havia muitas pedras e o reformismo tropeçou em todas

A atual socialdemocracia tem limitações da atuação na luta-de-classes e é traída pelos seus aliados burgueses. Mas não o faz por um espírito de traição, mas pela sua limitação de atuação. Se avançar mais do que isto deixará de ser socialdemocracia.

O Reformismo, adotado no final da II Guerra como instrumento de proteção à URSS, ainda é a via mais tentada pela maioria dos partidos considerados “progressistas”. Atrasou tanto o movimento político que vemos como a proposta econômica da grande maioria dos partidos comunistas a defesa do capitalismo desenvolvimentista.

Reformismo não é avanço, mas um retrocesso…

Por isto temos uma esquerda perdida no Brasil.

A histórica luta internacional das mulheres

Neste dia 08 de março de 2021 eu poderia apenas parabenizar o dia internacional das mulheres, tecer uma série de elogios e frases poéticas. Mas acho que este ainda é um dia de avaliação da situação e das vitórias que considero significativas.

O objetivo inicial da monogamia

Na minha opinião, um dos livros mais importantes para entender como as mulheres começaram a perder o seu poder é a compilação de trabalhos antropológicos, comentado por Friedrich Engels, denominado “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”. Os estudos não são do Engels, mas apenas as conclusões sobre eles.

Segundo estes estudos antropológicos, em determinada época da história humana, quando passávamos das hordas para grupos um pouco mais organizados, a estruturação social “pré-familiar” se dava a partir do conhecimento de quem eram seus descendentes. As relações sexuais se davam por um grupo de seres humanos férteis de determinada faixa etária. Desta forma, naturalmente, só as mulheres sabiam quem eram os seus filhos. Os homens não.

Saber quem são seus filhos dá a oportunidade de aglutinar pessoas em torno de si, por algum tempo, e herdar instrumentos e outros bens. É uma primeira forma de “acumulação”, que sugere um desenvolvimento do poder matriarcal. 

Não vou entrar na especulação das motivações, mas houve uma disputa pela herança do poder de agrupar outras pessoas e instrumentos em torno de si. Para que isto acontecesse, os homens resguardaram uma mulher para ter seus filhos. Assim tornaram-se herdeiros e acumuladores. O significado original da palavra “família” é “tudo aquilo que me pertence”, ou seja, mulher, filhos, instrumentos, locais de abrigo e moradia etc.Uma acumulação um pouco maior do que tinham as mulheres anteriormente.

O trabalho compulsório e outras escravidões

Outro momento da história da submissão das mulheres é citado no importante livro “O trabalho compulsório na antiguidade” de Ciro Flamarion Cardoso.

Esta, que também é uma compilação de trabalhos de mestrado e doutorado em antropologia, mostra vários tipos de trabalhos compulsórios no Egito faraônico, na Baixa Mesopotâmia, no mundo grego e no romano. Um bom estudo para entendermos as dinâmicas entre os trabalhos compulsórios e a entrada e saída da escravidão em diversas sociedades mostrando as ascensões e declínios sociais dos indivíduos.

Mas o que eu trago para este texto é a noção de que a escravidão, ou o trabalho compulsório se dava de maneira diferente entre os homens e mulheres. Nos períodos onde se debruçam estes estudos um homem escravizado, não necessariamente era encarcerado ou acorrentado. Dependendo das suas habilidades era aproveitado em trabalhos importantes, inclusive militares. Escravos guerreiros, frequentemente, eram recrutados para participar de guerras onde conseguiam dominar e governar os lugares conquistados. Homens também conseguiam obter sua liberdade através de pagamento, cujo dinheiro era obtido por trabalhos, mesmo na sociedade civil.

As mulheres submetidas ao trabalho compulsório ou escravidão, trabalhavam em atividades que não lhes rendiam dinheito suficiente para comprar sua liberdade: tecelagem, ajudas domésticas e cortesãs, por exemplo. Lembrando que a prostituição era um meio independente de acumular dinheiro. As prostitutas tinham mais chance de ascender socialmente que as cortesãs. Para estas obterem a liberdade, teriam que casar com um “homem livre”. Ou seja, a divisão do trabalho já colocava a mulher em uma desvantagem significativa, tornando dificílima a sua mobilidade social.

Revolução burguesa

Ouvi de uma professora de economia a frase “a Revolução Burguesa veio para nos dar liberdade sobre os nossos corpos”. Uma ingenuidade que ilude grande parte da nossa atual sociedade.

Realmente a Revolução Burguesa veio estabelecer novas relações de produção e consumo, assim como tirou do topo da cena uma inútil aristocracia, que se tornara obsoleta.

Mas a formação familiar burguesa não foi nada boa para a emancipação das mulheres. Ao contrário, encarcerou-as em uma gaiola dourada. Perderam direito de autodeterminação, de ascensão social em troca de se tornarem “a rainha do lar”. Ser mulher passa a ser apoiar o homem, dar filhos e ser responsável pela moralidade. Ao homem, tudo. Inclusive ter outras mulheres.

Um dos livros mais importantes sobre a consolidação da família burguesa chama-se “Madame Bovary”, de Gustave Flaubert. Narra a história de uma mulher casada com um homem, que tem todos os direitos, inclusive de ter amantes. Ela, infeliz no casamento, tenta a felicidade em um novo amor. Mas nada conspira a seu favor, tem uma vida extremamente sofrida, em que a angústia diante das impossibilidades de ter direito à felicidade faz com que ela acabe se suicidando.

A família a que todos se referem como do início da humanidade, na verdade é recente, nasceu na Revolução Burguesa que a controla com severidade. Como analisa o filósofo Foucault, esta revolução vigia e pune.

Da briga na cozinha à luta social

Mas a luta pela emancipação da mulher, nas últimas décadas, também foi distorcida por uma cortina-de-fumaça criada a partir das críticas de costume.

A discussão sobre quem deve lavar a louça, levar a criança à escola, ter um comportamento “assim ou assado” passou a ser referência para medir a igualdade entre os homens e mulheres. Estes são aspectos importantes apenas para a crônica de costumes.

A discussão e luta da emancipação das mulheres passa obrigatoriamente pela luta política e econômica. E não é apenas uma luta pela igualdade econômica se esta for feita igualando por baixo. 

Em determinado momento houve uma luta pela justa inserção das mulheres no campo do trabalho. Mas esta luta foi parcial e trouxe alguns problemas. As mulheres foram inseridas no sistema com salários abaixo dos dos homens. Em um segundo momento os salários dos homens foram rebaixados. Uma vitória parcial para as mulheres, mas uma perda geral dos trabalhadores. A inserção deve passar necessariamente por uma compreensão e  atuação política capaz de lutar pela igualdade salarial, por cima. Ainda vemos que as mulheres, no geral, ganham menos que os homens, e os homens ganham menos que antes.

Chegou a vez de ouvir as Marias, Mahins e Marielles

A problemática da subordinação social da mulher não diz respeito a um passado recente. Existe há milhares de anos e vem sofrendo mutações para tentar sobreviver sem ser muito percebida. 

Muito menos diz respeito a uma relação de costumes entre homens e mulheres. 

Para que as mulheres consigam a sua emancipação é necessário que estejam à frente de todas as lutas políticas e econômicas. 

Sem as mulheres à frente, nunca haverá mudanças sociais.

Pandemia e a morte dos indesejáveis

março de 2021

Boa origem

Desde o Século XIX circula uma ideia, entre alguns médicos e cientistas, de “purificar” a sociedade de “seres indesejáveis”. Naquela época os alvos desta eugenia (que em grego significa “boa origem”) eram pessoas com alguma deficiência mental, crianças com algum problema grave de saúde e deficientes físicos. Tinham como fundamentação teórica o conceito de seleção natural de Charles Darwin. 

Esta ideia eugenista foi bastante disseminada por Francis Galton, antropólogo e primo de Darwin, a partir de 1883. Galton queria comprovar que a capacidade intelectual seria hereditária. Assim justificava o extermínio de negros, imigrantes asiáticos e deficientes.

O objetivo de suas teses era aperfeiçoar a raça humana. Além das exclusões, Galton também sugeria que fossem evitados cruzamentos com seres humanos “indesejáveis”.

Galton estendeu as implicações da teoria da seleção natural, indicando que os seus estudos demonstravam que além da cor dos olhos, feição, altura e demais aspectos fisiológicos, também traços comportamentais, habilidades intelectuais, poéticas e artísticas seriam transmitidas dos pais aos filhos.

Exportação para o Brasil

O Brasil adotou a ideia e criou um movimento interno de eugenia. Médicos, engenheiros, jornalistas e a elite intelectual vislumbraram a eugenia como ‘solução’ para o desenvolvimento do país. 

Os negros eram responsabilizados pelas epidemias no país e a elite brasileira pregava a eugenia como um instrumento de “higienização-social”.

O Dr. Renato Kehl, renomado médico brasileiro, acabou se tornando o pai da eugenia no país.  Ele pregava a melhoria racial com um projeto de predomínio da raça branca.

Mas não só os cientistas e médicos aderiram ao movimento eugenista. Donos de jornais de grande circulação, membros da Academia Brasileira de Letras, fundadores de faculdades de medicina (Homenageado com uma avenida em São Paulo denominada Doutor Arnaldo) e o renomado escritor Monteiro Lobato.

Monteiro Lobato escreveu um livro denominado “O presidente negro – o choque das raças” que narrava a história de um homem negro que teria virado presidente dos Estados Unidos da América (no ano de 2228) e ironicamente teria unido os brancos para exterminar todos os negros do país.

Após lançar este livro, Monteiro Lobato envia uma mensagem para Renato Kehl:

“Renato, tu és o pai da eugenia no Brasil e a ti devia eu dedicar meu Choque, grito de guerra pró-eugenia. Vejo que errei não te pondo lá no frontispício, mas perdoai a este estropeado amigo. Precisamos lançar, vulgarizar estas ideais. A humanidade precisa de uma coisa só: poda. É como a vinha”.

Fonte: Lobato.” in História Viva , edição 49 – Novembro 2007 Eugenia, a biologia como farsa, por Pietra Diwan.

A eugenia nazista

Na Alemanha nazista um grupo de médicos e cientistas desenvolveu um projeto para “purificar” a sociedade germânica de “seres indesejáveis”. Eram indesejáveis não apenas os deficientes, negros etc. Os judeus também. Vivenciaram a sua Shoah (em hebraico significa catástrofe) com a morte de um milhão de crianças, dois milhões de mulheres e três milhões de homens. 

Sem fugir do espectro de fria crueldade, vimos uma condução irônica da purificação da raça ariana através de Hitler, Goering e Himmler que não eram arianos. Todos tinham deficiências indesejáveis.

Os economistas eugenistas

Mas o mundo avançou e o elenco de indesejáveis se ampliou. Os pobres, de qualquer raça ou cor e os que não geram nem consomem capital, entraram no grupo dos extermináveis. Trata-se de uma eugenia social. 

O liberalismo, na sua fase atual, não se interessa por quem não se torne um capital. Se não é ou gera capital é descartável. Mas o descartável tem custo. O pobre, o aposentado e o desempregado, por exemplo, geram custos ao Estado, aos bancos e às grandes corporações. Melhor seria se eles não existissem.

As guerras, a fome e a miséria são instrumentos razoáveis para o extermínio gradual e a diminuição de alguns custos. Mas uma epidemia virótica pode ser mais eficaz.

Pan-eugenia

Mas uma pandemia virótica aguda, desconhecida da medicina, tratada por sistemas de saúde colapsados, pode ser um grande instrumento. Não precisa gastar nada para exterminar os “indesejáveis”. É só não fazer nada. Nada de protocolos sanitários e nada de vacinas. Se possível, disseminar que as vacinas são perigosas e não imunizam.

O movimento eugenista não é exclusivo dos nazistas, mas eles ainda são os maiores especialistas.

Pandemoney

Uma pandemia também pode ser um bom negócio se for divulgado que alguns remédios podem curar a doença. Se a pessoa se curar, pode até achar que foi por causa de algum destes remédios. 

Ainda há outro aspecto pouco discutido. Na pandemia, várias empresas estão quebrando, principalmente as pequenas e médias. Mas muitas, principalmente, grandes empresas, cresceram e lucraram muito. Estas vão “engolir” as que quebraram. Assim como na crise de 1929 onde muitas empresas quebraram, mas foram criadas as maiores fortunas da época. 

Guerra é negócio. Crises financeiras provocadas (como as de 1929, 1979 e 2008) são negócios. E agora, pandemia também é negócio. 

Aos leitores

Leon Ayres

Sei que este texto pode aparentar uma teoria da conspiração ou exagerado. Se duvidar ou não, pesquise. O que não podemos é nos refugiar na ingenuidade do provocado desconhecimento.

As nossas responsabilidades e compromissos com a humanidade devem se refletir em ações para que exterminemos este indesejável projeto eugenista.

Missão cumprida!

Leon Ayres em 09 de fevereiro de 2021


“Cada vez que o homem escolhe seu compromisso e seu projeto com toda sinceridade e com toda lucidez, torna-se-lhe impossível preferir um outro.” Sartre

Sou analista de sistemas, servidor público do Ministério da Saúde desde 1991 quando saímos da Dataprev  para fundar o Datasus (órgão de Tecnologia da Informação do MS). Ao longo destes 30 anos participei do desenvolvimento de dezenas de sistemas para o SUS, tendo me especializado em informatização hospitalar.

Em 2018 trouxe para o município um sistema público e gratuito que acabou se denominando Prontuário Carioca Hospitalar (PCH). 

Trouxe comigo uma equipe muito experiente que já havia informatizado cerca de duzentas unidades de saúde (de baixa, média e alta complexidade) em todo o Brasil. Esta proposta se baseava em trazer um prontuário eletrônico para implantar nos quatro grandes hospitais de emergência. Havia uma grande facilidade para implantação: em 1995 já havíamos informatizado o Salgado Filho, e mais tarde o Lourenço Jorge, parte do Souza Aguiar, Miguel Couto e Raphael de Paula e Souza com o Sistema de Gerenciamento Hospitalar HOSPUB. Com o Prontuário Carioca Hospitalar os hospitais teriam o HOSPUB para fazer a administração e o PCH para atender à assistência (relação médico/paciente).

Fomos muito além daquilo que havíamos combinado

Também criamos:

  • o Prontuário Eletrônico para Dispositivos Móveis (para o cidadão ver seu prontuário no seu celular, micro ou tablet);
  • o Prontuário PET Carioca para fazer o gerenciamento e gestão das unidades veterinárias;
  • O Prontuário da Saúde Mental (o primeiro no Brasil);
  • O gerador de informações para rede de unidades de saúde denominado Gestor Municipal;
  • O Projeto CAF-AB para gerenciar a estocagem e distribuição de medicamentos na Atenção Básica, assim como o controle das solicitações do almoxarifado central;
  • Uma plataforma pública de Business Intelligence com dados de todo o Brasil, com acesso público. É utilizado por universidades, imprensa, Ministério Público e alguns órgãos de controle;
  • O Projeto de Automação dos Laboratórios de Patologia Clínica.

Quando fomos contratados pelo município o custo previsto para apenas colocação de um prontuário eletrônico era de 51 milhões de reais. Nós conseguimos desenvolver e implantar o Prontuário Carioca e os demais projetos por pouco mais de seis milhões de reais. Estes seis milhões de reais foram utilizados para aquisição de infraestrutura para implantação do PCH. Uma economia para o município de 45 milhões de reais! 

O que deixamos de infraestrutura para ser utilizada no Prontuário Carioca

Entramos com vários processos e adquirimos a infraestrutura necessária para implantar os nossos projetos.

  • 810 estações de trabalho;
  • 12 impressoras de código de barras;
  • 100 switches;
  • 36 servidores de aplicação;
  • 36 licenças de bancos de dados.

A nossa equipe desenvolve sistemas há mais de 30 anos como política de estado. Tanto faz qual é o governo. Não somos empresa e nem temos nenhum vínculo partidário.

No dia primeiro de janeiro de 2021 a área a qual pertencíamos (S/ATI), e que estava diretamente ligada ao gabinete da SMS, foi extinta. Dos oito profissionais que tratavam do treinamento, implantação e suporte operacional, sete foram demitidos. Desta forma fica totalmente prejudicada a implantação do Prontuário Carioca nas maternidades, hospitais de retaguarda e policlínicas, conforme havia sido planejado.

Implantações planejadas e concluídas

  • Hospital Municipal Souza Aguiar
  • Hospital Municipal Lourenço Jorge
  • Hospital Municipal Miguel Couto
  • Hospital Municipal Salgado Filho
  • Maternidade Leila Diniz

Implantações em andamento (paralisadas)

  • Hospital Raphael de Paula e Souza
  • Hospital Francisco da Silva Telles
  • Hospital Rocha Maia
  • Policlínica Rocha Maia
  • Maternidade Carmela Dutra
  • Maternidade do Miguel Couto

Implantações interrompidas

  • Hospital de Geriatria e Gerontologia
  • Hospital Maternidade Herculano Pinheiro
  • Hospital Municipal Albert Schweitzer
  • Hospital Municipal Álvaro Ramos
  • Hospital Municipal Barata Ribeiro
  • Hospital Municipal da Mulher Mariska Ribeiro
  • Hospital Municipal da Piedade
  • Hospital Municipal Evandro Freire
  • Hospital Municipal Nossa Senhora do Loreto
  • Hospital Municipal Paulino Werneck
  • Hospital Municipal Pedro II
  • Hospital Municipal Rocha Faria
  • Hospital Municipal Ronaldo Gazolla
  • Hospital Maternidade Alexander Fleming
  • Hospital Maternidade Fernando Magalhães
  • Hospital Municipal Jesus
  • Hospital Raphael de Paula Souza
  • Policlínica Antonio Ribeiro Netto
  • Policlínica Carlos Alberto Nascimento
  • Policlínica Hélio Pellegrino
  • Policlínica José Paranhos Fontenelle
  • Policlínica Lincoln de Freitas Filho
  • Policlínica Manoel Guilherme Pam Bangu
  • Policlínica Newton Alves Cardozo
  • Policlínica Newton Bethlem
  • Policlínica Rocha Maia
  • Hospital Maternidade Maria Amélia Buarque de Hollanda (OS)
  • Hospital Maternidade Fernando Magalhães
  • Hospital Maternidade Herculano Pinheiro
  • Hospital Maternidade Alexander Fleming
  • Hospital da Mulher Mariska Ribeiro
  • Maternidade do Hospital Municipal Pedro II
  • Maternidade do Hospital Municipal Albert Schweitzer
  • Maternidade do Hospital Municipal Rocha Faria
  • Casa de Parto David Capistrano Filho

Foi um prazer trabalhar para a cidade do Rio de Janeiro

Foram três anos de muito trabalho, com muitos resultados e que nos deram muito orgulho na realização. Cumprimos integralmente com os nossos compromissos, com o menor custo possível e deixando um legado para o município de vários prontuários modernos e fáceis de serem utilizados.

Quero agradecer a todos que trabalharam para construção e implantação destes projetos. Sou testemunha de que no município há muitos profissionais competentes e comprometidos em suas funções. Que fazem o melhor que podem, para o município, independente do governo. Aprendi muito e fiz muitos e muitos amigos.

Novos governos, novas políticas. Quem ganha tem o direito e responsabilidade de escolher suas políticas de governo e de estado. 

Hoje me sinto com a missão cumprida e orgulho da minha habitual independência.

Obrigado, meus amigos!



Clique aqui e conheça todos os projetos concluídos pela Assessoria Técnica da Informação da SMS do Rio de Janeiro entre os anos de 2018 e 2020.