Sobre o conflito da Rússia e Ucrânia

O fim da guerra fria

Para entender esta nova Guerra Fria precisamos voltar à primeira, após a queda do Muro de Berlim. 

Com a queda do Muro de Berlim houve uma grande reviravolta na economia da antiga União Soviética. Foi o período da Glasnost iniciado no governo de Mikhail Gorbachev.

Foi o início do liberalismo na União Soviética, que já era denominada Rússia.  A partir daí houve um verdadeiro colapso na economia. Muitos setores, como a  indústria e o comércio, foram praticamente paralisados. Naturalmente o desemprego disparou. 

O Sistema de Saúde foi sucateado e o Sistema de Proteção Social foi completamente destruído. Um verdadeiro colapso. Milhões de pessoas chegaram à linha da miséria.

As forças armadas também ficaram em condições deploráveis. Não era incomum, naquela época, vermos ex-militares traficando aviões de caça, que eram trazidos desmontados em aviões de carga civis. Tivemos um caso desses aqui mesmo no Brasil.

O bêbado equilibrista

Seguiu-se ao fraco governo de Mikhail Gorbachev o fraquíssimo governo de Boris Yeltsin. Um fantoche digno daqueles apresentados no desfile de carnaval pela Escola de Samba da Mangueira, em 2020.

Não foram apenas dez vezes que o presidente Boris Yeltsin apareceu em público completamente embriagado. Em algumas dessas aparições, ele teve que ser amparado pelos seus seguranças, para não cair no chão, alcoolizado.

Um homem que foi colocado pelo liberalismo ocidental para usar a pá-de-cal e enterrar a composição do grupo de países que compunham a antiga União Soviética.

O Partido Democrata, norte-americano, ou o Partido da Guerra, como é conhecido nos EUA, e os financistas da Wall Street, jogaram suas fichas para desestruturar a economia russa.  

Nesta tentativa de desconstrução da economia russa, sofreram bastante aqueles países que se beneficiaram da antiga União Soviética. Eram os mesmos, os direitos sociais e econômicos daqueles países. Com a desvinculação dos países que compunham o bloco, 25 milhões de pessoas tornaram-se estrangeiras da noite para o dia e passaram a ter direitos diferenciados.  Foi uma das maiores catástrofes sociais do Século XX. 

Em 1993, os deputados do parlamento russo se posicionaram contra a política de Boris Yeltsin, que mandou tanques dispararem contra o prédio do parlamento com balas que atingiram vários escritórios. Foram muitas manifestações populares e verdadeiras batalhas nas ruas com centenas de mortos. Bill Clinton se pronunciou dando total apoio a Yeltsin. Afirma Clinton: “Os Estados Unidos continuam firmes no apoio ao presidente Yeltsin”.

A política de Yeltsin-EUA estava dando resultado. Mas a situação caótica deu início a várias guerras civis por causa das diferenças e falta de uma política unificadora. Yeltsin renuncia em 1999.

A reviravolta russa

A partir do ano 2000 iniciou-se o governo Putin e a economia russa tomou outros rumos. O governo que se seguiu não tinha mais a linha soviética de atuação política e econômica. A Rússia começou a mudar, mas fora do campo liberal do ocidente. A Rússia começou a cuidar de si.

Uma das linhas de desenvolvimento passava pela pesquisa e Intensificação da indústria (tecnológica, eletrônica, petroquímica, agricultura etc.). Algo óbvio para qualquer tipo de governo que queira desenvolver o seu país.

Investiu em uma privatização mais equitativa sobre o controle de Estado. Algo que também é óbvio para qualquer tipo de governo. Nem os EUA, nem os europeus, nem as potências asiáticas abrem mão do controle do Estado sobre a economia. Se não vira quintal do sistema financeiro.

Quais foram os resultados dessa política:

  • Aumento do PIB;
  • Reforma das forças armadas;
  • Privatização mais equitativa, mais justa (estatais não foram vendidas “de graça”);
  • Encerrados os esquemas de formação de oligarquias (criação relâmpago de bilionários);
  • Estado tomou a responsabilidade pelas indústrias estratégicas;
  • Propriedades foram preservadas,, pois havia leis para protegê-las;
  • Empresas tiveram que assumir responsabilidades sociais;
  • A maioria dos empresários toparam,se  adaptaram e se sentiram mais confortáveis. Quem não ficou satisfeito: bilionários que enriqueciam, não por seus talentos empreendedores, mas pela capacidade de forçar o Estado a dar-lhes privilégios; 
  • Redução da taxa de pobreza em 2/3;
  • Aumento das pensões para idosos.

Em 2004 Putin foi reeleito com 70% dos votos. Ao longo do governo Putin a renda média subiu de 700 rublos (2000) para 29.000 rublos (2012). Ou seja, 4.142,85% (41 vezes). 

A Rússia quitou todas as suas dívidas de todas as repúblicas que compunham a antiga União Soviética, fato aprovado até pelo FMI. A dívida da Ucrânia era de US $16 bilhões.

Tudo isto atrapalhou os negócios financistas da Wall Street na Rússia. A política liberal ocidental começou a sentir cansaço na sua caminhada. Estavam perdendo o controle. Agora só restavam as guerras localizadas.

O governo dos EUA apoiou Bin Laden e Al-Qaeda contra a Rússia. O diretor da CIA no governo Reagan,  fez esforços para incitar os muçulmanos no Cáucaso (Ásia Central) contra a Rússia. O plano iria além de derrotar a Rússia no Afeganistão. Era tentar derrubar o regime. O plano, explícito, dos EUA continuou na Chechênia. No governo Bush houve apoio financeiro-militar, confirmado pelo próprio Bush . 

Mas a frágil e trágica estratégia americana fez com que seus aliados se tornassem inimigos, chegando a derrubar um dos seus maiores símbolos: as duas torres gêmeas…

Em matéria de política externa os EUA seguem a estratégia do “Tiro, Porrada e Bomba”. A tática atual é tentar obrigar os europeus a um novo enfrentamento mundial.

E o vento levou…

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) nasceu em 1949 para proteger o mundo contra a expansão comunista. Para se contrapor à OTAN, o bloco socialista criou o Pacto de Varsóvia. Foi o início da Guerra Fria.

Com a unificação da Alemanha (queda do Muro de Berlim) acordou-se que a atuação da OTAN não avançaria mais do que as fronteiras da Alemanha. Este foi um acordo verbal no período de Mikhail Gorbachev. Ou seja, as palavras o vento leva…

E o vento levou. Apesar de não haver mais nenhum conflito que caracterizasse a Guerra Fria, a OTAN veio avançando sobre a fronteira das antigas Alemanhas.

Há, desde o governo Clinton, um aumento considerável de investimentos militares. O Partido da Guerra investe pesado na sua maior arma de convencimento, apesar do jeito simpático dos seus grandes líderes.

Enquanto a Rússia investiu US $40 bilhões, os EUA chegaram a US $460 bilhões em 2016 durante o governo Obama. A simpática e bélica Hillary Clinton fez aumentar os investimentos militares em favor da intervenção na Síria, uma das suas guerras mais recorrentes. A soma de todo o investimento militar mundial é de US $600 bilhões.

Nos períodos dos governos do Partido da Guerra, o Pentágono considera a Rússia como a maior ameaça aos EUA.

A verdadeira ameaça

A verdadeira ameaça aos EUA gesta em suas próprias entranhas, assim como o Alien, o oitavo passageiro. A grande ameaça é sua economia que encontra-se em declínio há bastante tempo, há algumas décadas. 

Do ponto de vista externo os EUA estão diante do surgimento do Projeto Eurásia, com a criação da Nova Rota da Seda. Este é um dos maiores empreendimentos comerciais da história da humanidade e está conseguindo unir antigos rivais, como a China e a Rússia. 

A Nova Rota da Seda movimenta bilhões de dólares em uma rota comercial que se iniciou na Eurásia Central e se espalha por todo o mundo. Esta é a grande ameaça externa dos EUA. É rota de passagem esta região  onde encontram-se países que circundam o Mar Negro e Mar Cáspio. Com certeza é o alvo do Partido da Guerra através da sua tática de “Tiro, Porrada e Bomba”. A Ucrânia é um local taticamente importante e alvo de atividades geopolíticas comerciais. Quem dominar aquela área levará vantagem. 

Por isso, não imaginemos que este aparente conflito na Ucrânia se explique com estas notícias novelescas de defesa da democracia, aumento de terras ou mesmo problemas psicológicos de governantes.

Também não vamos deixar de levar em consideração que a China, que antes era quase que inimiga da Rússia, é a grande idealizadora e maior investidora da Nova Rota da Seda. Se a guerra acontecer, ela vai participar. Poderá ser uma guerra maior que todas as outras juntas!

A carta de Putin a Xi Jinping: "Rússia e China: uma parceria estratégica  orientada para o futuro" - SIC Notícias

Nem os ucranianos nem os europeus estão interessados neste conflito, pois todos estão se beneficiando desta nova rota comercial. 

Neste momento, o presidente Zelensky, que também é comediante, está tentando fazer o melhor roteiro possível para lidar com o pior drama na vida dos ucranianos.

Países não são amigos ou inimigos, eles têm interesses comuns e conflitos comerciais. Por estes conflitos comerciais eles vão à guerra, mas contam outra historinha para justificarem seus atos. 

Espero que o mundo não siga o desespero de um império que está se esgotando. O Império Romano passou por isso e os senhores feudais também. 

Toda crise gera oportunidades e nesta há a possibilidade de mudança de uma nova ordem mundial. Pense sobre a ordem mundial que você gostaria de ver. 

Como dizia Ariano Suassuna, “só nos resta tentar ver as coisas com realismo, pois o pessimista é um chato e o otimista um tolo”.