(Leon Ayres – fevereiro/2021)
Ao final da II Guerra Mundial os países que estiveram na hegemonia da guerra contra o nazismo sentaram-se para fazer um grande acordo com diversos objetivos diferentes. O que eu quero ressaltar é a parte do acordo de conciliação política.
No caminho tinha uma pedra (ou no caminho tinham duas pedras e uma tentativa de acordo)
Ao final da II Guerra encontraram-se no meio da Alemanha os dois grandes inimigos: capitalistas e comunistas. Naturalmente deveriam se enfrentar nesta fronteira da mesma forma que vinham se enfrentando desde 1919. Mas o mundo não tinha mais condições de continuar uma guerra, pois o enfrentamento nuclear resultaria em mais uma grande catástrofe mundial.
Do ponto de vista político-econômico, tanto para os comunistas quanto para os capitalistas, o melhor seria evitar a guerra e tentar ampliar as suas fronteiras político-econômicas.
De imediato os capitalistas fizeram um gigantesco investimento para garantir a recuperação econômica de dois países importantes, do ponto de vista geopolítico: Japão e cerca de metade da Alemanha. A Rússia, na expulsão dos nazistas do leste europeu, tinha ampliando a sua zona de atuação em diversos países, construindo a URSS.
Desde a crise de 1929, principalmente na Europa, os comunistas fizeram várias tentativas de tomar o poder de forma insurrecional, como na Alemanha, França, Itália e Espanha, por exemplo. Para os capitalistas este acordo político tentava mitigar as ações destes grupos.
Para os comunistas o acordo visava a sobrevivência da URSS, que vinha sendo bombardeada ininterruptamente desde 1919. Também tentava garantir a sobrevivência dos partidos comunistas pelo mundo. Com este acordo os partidos comunistas mudariam suas atuações utilizando então as eleições burguesas para ascender ao poder governamental.
Luta-de-classe (ou briguinha-de-classe)
Sai a ideia de “revolução comunista” e entra a “eleição comunista”. Na Europa a adesão dos partidos comunistas foi significativa. Mas nem todos os partidos comunistas pelo mundo reafirmaram esta política conciliatória de sobrevivência. Muitos julgaram que alinhar-se à URSS poderia significar abrir mão de atuações políticas locais. Tornaram-se partidos comunistas não alinhados. Um partido alinhado pode acabar não podendo tomar decisões independentes, pois podem interferir nos interesses locais da URSS.
A luta-de-classes tem estágios diferentes. A luta-de-classes na Europa está em um estágio diferenciado da dos países “colonizados”. Então a luta política se dá de maneira diferente em cada local. A luta política insurrecional pode não ser um instrumento na Europa, mas sim nos países latino-americanos, africanos e asiáticos, por exemplo. O alinhamento tenderia a tirar a independência dos movimentos políticos locais em favor de uma política mais geral da URSS. E foi o que aconteceu.
As flores de plástico não morrem
As flores não nascem onde as condições não sejam favoráveis. Na eleição burguesa não há espaço para a revolução comunista. Afinal, qual é a tarefa de um governo constituído de comunistas para gerenciar uma economia capitalista?
Surge então a consolidação da ideia de construção política de reformas em etapas. Assim se daria a transformação de uma política econômica capitalista em uma política econômica comunista.
Surge o movimento comunista reformista que influenciaria diversas linhas políticas. Em função desta mudança de paradigma, algumas terminologias mudaram de significado: socialismo e socialdemocracia. Estes termos tinham significados políticos bem diferentes.
Progressistas?
A limitação de atuação dos antigos partidos comunistas levou o movimento popular a certo declínio. A luta política tornou-se mais eleitoral e com períodos definidos de acirramento. As regras de atuação passam a obedecer à preservação da própria democracia burguesa. Uma verdadeira “luta-sem-classe”.
E foi neste marasmo e vácuo político que cresceram os socialdemocratas, os socialistas, os trabalhistas e outras linhas que atualmente são denominadas “campo progressista”.
Neste início do Século XXI, a socialdemocracia ascendeu a governos na Europa e América Latina. Alguns se autodenominavam socialistas. Uma grande ilusão simbólica de emancipação da classe trabalhadora. Ao longo destes governos o tradicional abandono da luta-de-classes pela socialdemocracia criou governos conciliatórios que pareciam avançar a conjuntura, tal qual a ideia reformista.
Migalhas mínimas
Como não existe espaço vazio na política, no Brasil, a socialdemocracia também nasceu por causa da pouca atuação política dos partidos comunistas.
Elegeram seu presidente da república e construíram o seu projeto conciliatório. O movimento sindical e popular foi arrefecido para evitar constrangimentos ao governo. Programas de “bolsas-marmitas” traziam uma horda de novos consumidores às urnas, ao longo de mais de uma década.
Consumidores não são base ou militantes políticos. Arrefecer os movimentos faz parte do movimento conciliatório, tal qual vimos no acordo entre os capitalistas e comunistas após a II Guerra. Acaba minando as próprias forças populares que são os agentes e beneficiários do avanço social. O que vem em seguida é um governo fascista que se aproveita da fraqueza da socialdemocracia. No final das contas o Reformismo devolve à burguesia os seus direitos originais no capitalismo.
No caminho havia muitas pedras e o reformismo tropeçou em todas
A atual socialdemocracia tem limitações da atuação na luta-de-classes e é traída pelos seus aliados burgueses. Mas não o faz por um espírito de traição, mas pela sua limitação de atuação. Se avançar mais do que isto deixará de ser socialdemocracia.
O Reformismo, adotado no final da II Guerra como instrumento de proteção à URSS, ainda é a via mais tentada pela maioria dos partidos considerados “progressistas”. Atrasou tanto o movimento político que vemos como a proposta econômica da grande maioria dos partidos comunistas a defesa do capitalismo desenvolvimentista.
Reformismo não é avanço, mas um retrocesso…
Por isto temos uma esquerda perdida no Brasil.